Um raio-x da televisão portuguesa: o que se vê por aqui!

Ah, a televisão portuguesa, um verdadeiro universo à parte, mas com um quê de familiaridade para quem cresceu assistindo a TV brasileira. Acredite: em meio a tantas diferenças, há muita semelhança com o que passa hoje ou já passou em algum momento no Brasil.

É como encontrar um primo distante que compartilha muitas características da família, mas com um sotaque diferente. De tédio, você não morre, ainda mais se tiver um olhar antropológico para a coisa.

Um raio-x da TV portuguesa

Na coluna deste mês, quero falar um pouco sobre o que você, que pretende se mudar para Portugal ou tem interesse pelo país, encontrará, principalmente nos canais abertos. Eu sei que muita gente vem trocando a TV tradicional com seus horários fixos e programas repetidos pelos streamings da vida, mas acredito que você conhece um pouco mais sobre um país vendo televisão.

Sempre que visito um novo lugar, gosto de gastar algumas horas vendo TV e ouvindo um pouco de rádio. Afinal, as emissoras refletem a cultura, os gostos e hábitos da sociedade. E isso é fundamental para um imigrante, que quanto mais se integra à cultura, mais à vontade fica.

Assim como nas TVs do mundo todo, há programação por aqui para todos os gostos, até os mais duvidosos.

Os portugueses sabem muito sobre o Brasil

Mesmo sendo filho de portugueses, eu pouco sabia sobre a televisão lusitana antes de chegar aqui. Infelizmente, apesar dos laços entre Portugal e Brasil, os portugueses têm muito mais interesse pela cultura brasileira do que o contrário.

Você que está no Brasil, pense comigo: quantas vezes por dia você ouve alguma notícia sobre Portugal por aí? Poucas, né? Pois, então, eu nunca tinha ouvido falar de nomes de peso daqui como Cristina Ferreira, João Baião e Manuel Luís Goucha. Você, provavelmente, também nunca ouviu falar deles. Não que isso tenha uma enorme importância, mas os 3 são apresentadores muito populares na terrinha.

Canal SIC nasceu há pouco mais de 30 anos

Então, vamos começar falando dos canais mais emblemáticos, os mais conhecidos. A SIC, com sua qualidade e variedade de programação, poderia facilmente ser considerada a “TV Globo portuguesa”. Essa semelhança não é à toa: as duas emissoras têm parceria de conteúdo desde 1992, quando a SIC entrou no ar.

Sim, ela é relativamente recente, ainda mais quando você compara com a Globo que foi ao ar pela primeira vez em 1965. Foi a primeira emissora privada de televisão em Portugal. Sua entrada no mercado representou uma mudança radical na paisagem televisiva do país, antes dominada pela RTP, emissora pública.

Na SIC tem o “A Máscara”

É conhecida por seus programas de entretenimento de sucesso, como o talk show “Alta Definição”, que recebe personalidades de diversas áreas para entrevistas intimistas e emocionantes. Nela passa também o “Masked Singer”, formato conhecido internacionalmente que também passa no Brasil. Aqui ganhou o nome de “A Máscara”.

Alguns pacotes de TV paga no Brasil incluem a SIC, então ela acaba sendo mais conhecida do público. Em termos estéticos e até de conteúdo, não deixa nada a desejar a grandes emissoras internacionais. Disputa ponto a ponto a audiência com o outro canal, não muito falado no Brasil: TVI.

TVI também tem pouco mais de 30 anos

A TVI seria equivalente ao SBT no Brasil. É um muito colorido e animado, onde passa o Big Brother português. Está no ar desde 1993.

Deixo duas curiosidades sobre esse programa que ainda passa em vários lugares do mundo: aqui ele dura praticamente o ano inteiro, alterando apenas os participantes. Alguns vão passando de uma edição para outra. O que muda mesmo é o apresentador, mas a estrutura do programa é praticamente igual. Muitos brasileiros já passaram pelo reality: alguns deixaram boa impressão, outros nem tanto.

Mais um aspecto interessante é que a atração é co-apresentada por uma voz masculina que age como dono da casa. Trata-se de um locutor, que nunca aparece, mas dá as ordens sobre o que deve ser feito: quem permanece no jogo e até quem é “nomeado”, ou seja, quem vai para o paredão. Ele é o “Big Brother”.

É na TVI que Cristina Ferreira e Manuel Luís Goucha, nomes que citei lá em cima, dão expediente. Goucha apresentava um programa matinal e foi transferido para a tarde, onde faz um programa diário de entrevistas que leva seu nome. Cristina, além de apresentadora de vários programas, é diretora de entretenimento e ficção da emissora.

RTP, a emissora pública

Agora falemos da RTP. Ela oferece uma mistura interessante de conteúdo, desde o entretenimento até o jornalismo. Aqui temos mais uma franquia de sucesso: “The Voice Portugal”. O programa busca talentos musicais e tem a mesma estrutura do original, que também passava no Brasil. Por ali já apareceram alguns talentos brasileiros que moram na Europa e foram tentar a sorte.

Nos anos 1990, a RTP era transmitida no Brasil através da extinta TVA. A família lá em casa matava a saudade de Portugal com a programação rica e diversificada do canal. Meu pai era fã de carteirinha e vivia grudado ao “ecrã” (tela) da TV, curtindo as belas imagens bucólicas do interior do país.

Destaco também um programa em que os participantes precisam acertar preços de produtos. É um formato que já circulou por alguns canais brasileiros. Trata-se da franquia de um game show americano. Por aqui chama-se “O Preço Certo” e é apresentado por um Fernando Mendes, um humorista, antigo conhecido dos portugueses.

Na plateia, grupos de senhores e senhoras trazem um pouco da cultura das suas aldeias, principalmente na época das festas populares, conversam com o apresentador e participam das brincadeiras.

A cereja do bolo: os programas dos fins de semana

Preciso comentar sobre os fins de semana destes canais que mencionei! É como reviver o Domingo Legal do final dos anos 1990/2000 com Gugu, no SBT, só que com um toque português.

As emissoras invadem cidades do país com um caminhão e um palco com muita dança e festa, tudo transmitido ao vivo. São programas longos que, muitas vezes, duram a tarde inteira. É comum ver bailarinas, um pouco fora do ritmo e com roupas curtas, mesmo no frio do inverno. A plateia aparece sempre muito animada, faça chuva ou faça sol.

São vários apresentadores que se revezam, música típica e comidas tradicionais, que vão do chouriço ao pastel de nata. Todas as 3 emissoras abertas transmitem programas semelhantes, principalmente no domingo à tarde. Em ocasiões especiais, até nos sábados.

E, claro, não poderiam faltar os sorteios de prêmios, como carros e dinheiro, para deixar os telespectadores na expectativa. Coisa muito comum em todos os canais durante esse tipo de programação. Você liga, gasta seus “euritos” suados e fica esperando receber a ligação da emissora ao vivo.

E como é a programação matinal?

É muito parecida em todos os canais: começa com o noticiário até mais ou menos umas 9 da manhã. Segue com um programa misturando assuntos da atualidade, convidados e receitas.

É como se a Ana Maria Braga e Patrícia Poeta decidissem fazer um programa juntas em terras lusitanas. Não é algo muito diferente do que acontece nas manhãs das TVs do mundo todo.

Já na hora do almoço…

Só que, na hora do almoço, a coisa toma um rumo curioso: esses mesmos programas, que passaram a manhã falando de amenidades, passam a apresentar os crimes das cidades portuguesas. O cardápio é variado: dos mais leves aos mais pesados.

Mostram uma reportagem sobre o tema, com direito repórter falando do local, e no estúdio especialistas e comentaristas (ou comentadores como se diz aqui) falam longamente a respeito. Não é o tipo de conteúdo que eu goste de ver no momento da refeição, mas há estômago para tudo.

Aliás, há um canal a cabo que se dedica, quase o tempo todo, a falar da criminalidade em Portugal. É o CMTV. É uma desgraça atrás da outra.

Há coisas inusitadas como o cachorro que mordeu a própria dona numa aldeia até coisas mais pesadas como homicídios e roubos. Vale ressaltar que em Portugal também há criminalidade, mas não chega aos pés do que acontece no Brasil.

Vamos acompanhar as notícias do dia

Voltando para a TV aberta. À tarde, as emissoras nos presenteiam com um misto de programa de entrevistas e novelas, brasileiras e portuguesas, mantendo os espectadores entretidos até a hora do jantar. É quando os telejornais vão ao ar em quase todos os canais, por volta das 8 horas da noite. Tratam de notícias de Portugal e do resto do mundo, aliás, volta e meia falam do Brasil. É o horário com maior audiência.

Ao contrário da TV aberta brasileira, aqui praticamente não há noticiário local, sobre o que acontece em sua região. Por conta das dimensões do país, as informações sobre as cidades vão ao ar no jornal para o país inteiro mesmo.

E os filmes?

Na programação diária, as emissoras praticamente não passam filmes, exceto se for Natal ou Ano Novo. Nesse período, pouca coisa vai ao ar ao vivo, a não ser nos canais de notícias.

Dificilmente você vai ver algum filme em versão “dobrada” (ops, dublada). Só aqueles destinados ao público infantil. Na maior parte das vezes, você terá filmes no idioma original com legendas.

E a Globo? Tem?

Talvez você esteja se perguntando: e a TV Globo, tem em Portugal? Vou ficar sem minhas novelas? Passa tudo igual ao Brasil, né? Não! Para isso, você precisa assinar o Globoplay.

A TV Globo Portugal, disponível nas operadoras, é diferente. É como se o canal Viva atravessasse o oceano, trazendo produções brasileiras, incluindo série e novelas, para os corações portugueses e brasileiros saudosos. Aqui eles misturam o conteúdo da TV aberta com outros do Globoplay, GNT e Multishow, mas nem sempre as novelas que estão no ar no Brasil passam por aqui.

Assim é a TV portuguesa, uma mistura deliciosa de familiaridade e surpresa, que nos faz sentir em casa, mesmo estando do outro lado do Atlântico.

Espero que, de alguma forma, tenha matado um pouco da sua curiosidade sobre o que se passa na telinha tuga. Como trabalhei em TV no Brasil, gosto do tema e queria muito saber sua opinião. O que mais gostaria de conhecer sobre a cultura portuguesa? Não pense duas vezes, pode me mandar uma mensagem, que vou adorar conversar com você que tem interesse por Portugal.