A crise imobiliária na Alemanha atinge um ponto alarmante e está exigindo a atenção imediata das autoridades, uma vez que afeta não apenas o setor habitacional, mas gera consequências significativas para a economia e a qualidade de vida dos cidadãos.

Crise imobiliária na Alemanha vem aumentando nos últimos anos
Índice Alemanha está longe de atingir a meta de 400 mil novas moradias Custos de materiais influenciam a crise imobiliária Crise também dificulta empréstimos para compra de imóveis Agravamento da crise imobiliária também impacta os aluguéis Déficit habitacional bate recorde Impacto da chegada de refugiados e construção insuficiente Discriminação no mercado imobiliário alemão “Crise de Realocação” para refugiados na Alemanha Alternativas de moradia Medidas do governo alemão para combater a crise habitacional

Segundo o jornal alemão Tagesschau, a situação da crise se agravou, evidenciando custos crescentes, interrupção de projetos em andamento e falências de empresas. Contrariando as expectativas, a queda nos preços imobiliários não sinaliza uma recuperação. O Governo criou medidas pertencentes à “Cúpula da Construção de Moradias” que devem ser implementadas urgentemente para estabilizar a situação imobiliária no país.

Alemanha está longe de atingir a meta de 400 mil novas moradias

Os custos elevados de financiamento e construção têm sido fatores determinantes para a desaceleração significativa da construção de novos imóveis na Alemanha. Muitas construtoras estão suspendendo seus projetos, paralisando dezenas de milhares de empreendimentos planejados.

Conforme dados do Escritório Federal de Estatísticas (Destatis), em julho de 2023, foram concedidas licenças para a construção de 21 mil unidades habitacionais em toda a indústria.

Isso representa uma queda de 31,5% em comparação com o ano anterior, indicando uma tendência preocupante. Nos primeiros sete meses do ano, a redução atingiu 27,8%, claramente um desafio para o setor.

No governo, a Ministra da Construção, Klara Geywitz, admite a incapacidade do país para atingir a meta de construir 400 mil novas moradias. Nos primeiros sete meses, apenas 156.200 novas moradias foram aprovadas. O mesmo cenário se repete para casas unifamiliares, com uma queda de 36,5% nas licenças de construção para este tipo de habitação.

Custos de materiais influenciam a crise imobiliária

Dois fatores principais impulsionam a queda na atividade de construção. Desde meados de 2022, as taxas de juros foram significativamente elevadas pelo Banco Central Europeu (BCE), resultando em taxas de juros de construção entre 4% e 5%.

Adicionalmente, os custos de construção na Alemanha aumentaram devido ao encarecimento da energia, preços mais elevados dos materiais e dificuldades de entrega.

Financiar novos projetos de construção tornou-se uma tarefa cada vez mais difícil, se não impossível, para muitos desenvolvedores e construtores privados. O impacto é visível nas falências crescentes de empresas de construção, como a Centrum-Gruppe, quatro empresas do desenvolvedor Gerch e três empresas do Grupo Imobiliário Project de Nuremberg, segundo a publicação do jornal Tagesschau.

Crise também dificulta empréstimos para compra de imóveis

A crise imobiliária não se limita apenas à escassez de construções e à paralisação de projetos, mas impacta também diretamente nos preços dos imóveis e, consequentemente, nas dificuldades enfrentadas pelos cidadãos em busca de empréstimos para compra de casa na Alemanha.

Variação nos preços

Os custos crescentes de financiamento, somados à elevada inflação, vêm comprometendo o poder de compra dos alemães ao longo do tempo. Como resultado, os preços imobiliários registraram uma queda pelo segundo ano consecutivo, com uma redução média de 9,9% no segundo trimestre de 2022, conforme os dados mais recentes do Escritório Federal de Estatísticas. Essa queda representa o maior declínio desde o início da série temporal em 2000.

Com maior foco em Berlim, Hamburgo, Munique, Colônia, Frankfurt am Main, Stuttgart e Düsseldorf, a diminuição de preços foi mais expressiva. Nesses locais, residências privadas e apartamentos ficaram 12,6% mais baratos, e os compradores pagaram em média 9,8% a menos em comparação ao ano anterior.

Hamburgo, na Alemanha
Hamburgo apresentou uma queda nos preços, mas o poder de compra dos alemães também diminuiu.

Apesar dessas reduções, é importante destacar que, principalmente nas grandes cidades como Frankfurt am Main e Munique, os preços permanecem elevados. Segundo o “Global Real Estate Bubble Index”, Frankfurt tem um índice de 1,27, enquanto Munique registra 1,35. Uma cidade é considerada em risco de uma bolha imobiliária quando o índice atinge 1,5.

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Desafios nos empréstimos para compra de imóveis

A dinâmica de queda nos preços imobiliários, embora aparentemente positiva para potenciais compradores, esconde desafios significativos no acesso a empréstimos para aquisição de propriedades.

O aumento dos custos de financiamento e a instabilidade no mercado imobiliário tornam a obtenção de empréstimos uma tarefa árdua, impactando diretamente aqueles que buscam realizar o sonho da casa própria.

Agravamento da crise imobiliária também impacta os aluguéis

A crise imobiliária na Alemanha atinge não apenas aqueles que buscam comprar uma casa, mas também os locatários, que enfrentam aumentos significativos nos custos de aluguel.

Há milhares de moradias em falta no país, especialmente nas faixas de preço mais acessíveis. É o que indica o estudo divulgado pela Associação Alemã de Inquilinos (Deutscher Mierterbund).

Aumento alarmante nos valores de aluguéis

Enquanto a falta de moradia atinge a população, os aluguéis continuam sua trajetória ascendente. Segundo a Associação Alemã de Inquilinos, os aluguéis em cidades-chave, como Berlim, Hamburgo, Munique, Colônia, Frankfurt, Düsseldorf, Stuttgart e Leipzig, tiveram um aumento médio de 6,7% durante o primeiro semestre.

Em Berlim, esse aumento foi ainda mais expressivo, atingindo 16,7% em comparação com o ano anterior. Destaca-se que Munique lidera como o mercado de aluguel mais caro, com um valor de 22,25€ por metro quadrado.

Déficit habitacional bate recorde

A crise imobiliária na Alemanha atingiu um ponto crítico, com a maior escassez de moradias em mais de 20 anos, segundo um estudo do Instituto Pestel, em Hannover, a pedido da aliança “Moradia Social”. Atualmente, mais de 700 mil moradias estão em falta no país.

Um brasileiro em meio à crise imobiliária em Berlim

O brasileiro Arthur Almeida, de Campina Grande, vive no país desde março de 2018 e compartilha sua trajetória e os desafios diante da crise imobiliária na capital alemã.

Em entrevista, Arthur destaca que, ao se mudar para sua segunda morada na Alemanha, em Berlim, em julho de 2019, enfrentou a realidade de precisar dividir uma casa com sete pessoas.

Ao buscar uma morada permanente com seu marido, enfrentaram obstáculos que permanecem até hoje. Apesar de ambos terem fontes de renda, a resposta durante a procura por um apartamento era frequentemente negativa, levando-os a concluir que o problema residia na questão financeira.

Brasileiro que vive em Berlim conta sobre a crise imobiliária na Alemanha.
Arthur Almeida vive em Berlim desde 2019 em um flat compartilhado com outras pessoas.

Mesmo após esperarem dois anos e meio, até o final de 2022, quando o marido concluiu seu curso e obteve um emprego fixo, a busca por moradia continuou sendo um desafio.

“Nós voltamos a procurar por apartamentos, porque a gente pensou: ah, agora que estão os dois com emprego fixo, os dois com contrato ilimitado, nós iremos conseguir. E continuamos a procurar, a gente escrevia para uns 30/40 apartamentos de uma vez pela internet, e recebia mais ou menos, menos de 10% de resposta nos convidando para uma visita”.

Arthur ressalta que a demanda intensa por apartamentos em Berlim cria uma competição imensa, com muitos imóveis sendo alugados antes mesmo de chegarem aos sites de busca. Observando a situação de conhecidos, ele destaca que, muitas vezes, a chave para conseguir um apartamento está em conexões pessoais, onde amigos repassam seus imóveis para conhecidos.

O brasileiro acredita que a falta de referências, como conta bancária na Alemanha e endereço, pode influenciar nas decisões de locadores, especialmente quando comparado a candidatos alemães que têm como comprovar referências.

Atualmente, ainda sem encontrar uma morada definitiva em Berlim, Arthur comenta que, algumas vezes, chega a pensar na possibilidade de mudar, apenas em consequência da dificuldade em encontrar um imóvel.

“Nós sempre soubemos que ia ser difícil, que teríamos que passar por isso, mas achávamos que quando chegasse em um certo ponto, que os dois tivessem trabalhando, ganhando um bom salário, que nós iríamos conseguir, mas não conseguimos. Nós passamos 3 anos procurando e não conseguimos”, comenta.

Impacto da chegada de refugiados e construção insuficiente

O estudo aponta que, no ano passado, mais de um milhão de refugiados da guerra na Ucrânia chegaram à Alemanha, somando-se a cerca de 218 mil novos pedidos de asilo.

Além disso, construção de moradias foi prejudicada pelo aumento das taxas de juros de construção e pelos custos crescentes, resultando em uma crise aguda, especialmente no segmento de moradias sociais e aluguéis acessíveis.

Cerca de 20 mil moradias sociais foram construídas na Alemanha no último ano, muito aquém da meta do governo federal de 100 mil moradias sociais anualmente e um total de 400 mil novas moradias.

A urgência da situação levou o governo a propor a criação de um fundo especial de 50 bilhões de euros, dos quais três quartos seriam fornecidos pelo governo federal e o restante pelos estados.

Discriminação no mercado imobiliário alemão

A busca por moradia na Alemanha revelou-se discriminatória para aqueles com nomes de origem estrangeira, conforme constatou uma coleta de dados realizada pela plataforma Wunderflats, divulgada pelo jornal alemão Frankfurter Rundschau. A análise mostrou que, na concorrência acirrada por moradias, pessoas com nomes estrangeiros são prejudicadas.

Os resultados da pesquisa revelam que, em média, 4% a mais de apartamentos foram alugados quando os nomes dos interessados foram ocultados durante um teste realizado pela plataforma.

A discriminação com base na origem é proibida por lei na Alemanha, mas ainda persiste, e essa prática impacta negativamente a busca por moradia, especialmente para estrangeiros e estudantes.

Estrangeiros e estudantes em desvantagem

Para profissionais estrangeiros e estudantes, encontrar moradia na Alemanha já é particularmente desafiador. A pesquisa da Wunderflats destaca que a origem do interessado muitas vezes influencia as decisões dos proprietários.

O CEO da plataforma, Jan Hase, compartilha uma experiência pessoal, mencionando que sua noiva, ao usar um nome alemão em vez do polonês, experimentou um aumento significativo nas respostas positivas ao procurar apartamentos.

No caso de estrangeiros e estudantes que buscam moradia temporária, a situação é ainda mais complicada, uma vez que a obtenção de um endereço alemão é essencial para garantir uma conta bancária e, por consequência, uma verificação SCHUFA, uma espécie certificação de situação financeira, também é exigida.

A Wunderflats visa enfrentar esses desafios, oferecendo uma solução mais inclusiva e combatendo a discriminação no mercado imobiliário alemão.

Estudantes são afetados pela falta de opção para moradia

Diante da crise imobiliária, quem estuda na Alemanha busca alternativas para contornar a escassez de moradias acessíveis. Muitos enfrentam dificuldades crescentes, recorrendo a soluções temporárias como albergues, campings e até quartos de criança, segundo o Tagesschau.

Prédio antigo em Berlim, na Alemanha
Residências estudantis também estão sendo afetadas com a crise imobiliária na Alemanha.

O aumento na demanda torna os dormitórios estudantis uma opção saturada, forçando os estudantes a encontrar abrigo em locais inusitados. Com a pressão adicional dos custos de aluguel, que aumentaram significativamente em várias cidades universitárias, muitos estudantes estão considerando a opção de morar com os pais, levantando preocupações sobre o impacto econômico nas escolhas acadêmicas.

Propostas para construção de novos dormitórios já surgem, como o planejado pela Studentenwerk em Münster, no entanto, a lista de espera já conta com milhares de estudantes.

A situação revela uma grande necessidade de soluções urgentes de apoio financeiro aos estudantes e o desenvolvimento de moradias mais acessíveis para garantir que a crise imobiliária não se transforme em obstáculos na formação dos estudantes.

“Crise de Realocação” para refugiados na Alemanha

Em meio à crise imobiliária na Alemanha, refugiados enfrentam dificuldades crescentes para encontrar moradia, agravando a chamada “crise de realocação” nos abrigos.

Municípios enfrentam limitações significativas de espaço para acomodar refugiados, como evidenciado recentemente no distrito de Fulda, em Hessen, como publicado pelo Deutsche Welle.

Pesquisadores apontam para uma “crise de realocação”. Cerca de 25% das pessoas que chegaram à Alemanha em 2015/2016 ainda residem em abrigos para refugiados, evidenciando um congestionamento no sistema de recepção. Especialmente em áreas com mercados imobiliários tensos, refugiados reconhecidos têm dificuldades em encontrar habitação própria.

Soluções e flexibilidade na acomodação

Cidades como Düsseldorf buscam soluções proativas, implementando gerenciamento de realocação para encontrar apartamentos para refugiados reconhecidos.

Essas iniciativas incluem convencer proprietários privados, aliviando medos e preocupações, e oferecer conceitos como “morar em caráter experimental”. Em Baden-Württemberg, uma rede de cidades colabora para encontrar moradias, incluindo subsídios para renovação e garantias de aluguel.

Apesar dessas iniciativas, os desafios persistem. A rejeição de pedidos de asilo continua alta, com 48% dos processados no primeiro semestre de 2023 sendo rejeitados. Cada vez mais municípios buscam designar refugiados com perspectiva de permanência, enquanto a busca por soluções inovadoras e flexíveis permanece crucial para enfrentar a crescente crise de moradia para refugiados na Alemanha.

Alternativas de moradia

Tanto para os cidadãos locais quanto para os estrangeiros, a busca por moradia tem sido um desafio. Diante dessa realidade, alguns procuram outras alternativas para garantir habitação. Muitos têm encontrado soluções viáveis por meio do compartilhamento de apartamentos, conhecido como “Wohngemeinschaft” (WG).

O “WG” é um estilo de moradia onde várias pessoas dividem um mesmo espaço, cada um ocupando seu próprio quarto e dividindo as despesas, reduzindo consideravelmente os custos. Além das opções de repúblicas de estudantes, que têm um conceito parecido com o WG, no entanto, há uma limitação de oferta.

Essas alternativas têm se tornado boas opções, especialmente em áreas urbanas onde a demanda por habitação é mais acirrada. No entanto, mesmo estas alternativas têm se tornado cada vez mais difíceis, uma vez que a procura tem aumentado exponencialmente nos últimos anos.

Medidas do governo alemão para combater a crise habitacional

O governo alemão, liderado pelo Chanceler Olaf Scholz, anunciou uma série de medidas destinadas a enfrentar a crise habitacional no país, em uma cúpula da construção em Berlim.

Com um total de 14 medidas, a coalizão “Ampel”, nome dado à coalizão dos três partidos que governam o país em conjunto, visa impulsionar a construção habitacional, reconhecendo a urgência da falta de moradias acessíveis.

Incentivos fiscais e “Bônus climático”

Para estimular a construção, o governo alemão oferecerá benefícios fiscais por meio de regras de depreciação especiais em projetos de construção.

Além disso, o “bônus climático”, destinado a incentivar a substituição de sistemas de aquecimento antigos e poluentes por alternativas ecológicas, será ampliado e estendido a empresas de aluguel e proprietários.

Ajustes nos valores máximos de crédito

O governo planeja facilitar a aquisição de propriedades residenciais, aumentando os valores máximos de crédito em 30 mil euros e elevando o limite superior de renda tributável de 60 mil euros para 90 mil euros. O programa “Propriedade Residencial para Famílias” terá esses ajustes para incentivar mais famílias a participar.

Será disponibilizado um título de programa no valor total de 18,15 bilhões de euros para construção habitacional social no período de 2022 a 2027. Este financiamento visa impulsionar a construção de moradias acessíveis em áreas com mercados habitacionais tensos.

Utilidade pública de habitação

O governo também planeja lançar a utilidade pública da habitação no próximo ano, beneficiando fiscalmente os proprietários de imóveis que disponibilizarem moradias acessíveis de maneira duradoura.