Quando pensamos em morar no exterior, temos a consciência que vamos entrar em contato com uma nova cultura e que precisaremos nos adaptar a ela. Em se tratando de viver em outro país, logo imaginamos que os costumes e tradições serão diferentes, a maneira de se vestir, a comida, a música, o idioma, enfim, tudo que é facilmente percebido no dia a dia. Mas será que é só isso?  Posso te assegurar que não.
Mais do que isso, temos que levar em consideração outras questões que vão muito além, pois são fatores internos, que não podem ser vistos, mas que são sentidos e muitas vezes sem muita clareza do que está acontecendo. Saiba mais no artigo a seguir.

Não sou mais o mesmo depois que mudei de país, por quê?

Gosto muito de utilizar a explicação da psicóloga norte-americana Lois Bushong, que trabalha com crianças e adultos de terceira cultura (TCK – Third Culture Kids) sobre identidade cultural. Apesar dos estudos dela serem voltados a este público, o Iceberg da Identidade Cultural que ela utiliza pode ser usado, também, para os migrantes.

Iceberg da Identidade Cultural

Muito mais do que as diferenças culturais, as pessoas que migram para outros países acabam construindo uma identidade cultural.
Olhando para o iceberg da identidade cultural, na parte visível estão: vestimentas, comida, idioma, etnia, gênero e tradições.
Já na parte submersa, estão questões como: valores culturais e pessoais, adaptabilidade, lutos mal resolvidos ou lutos migratórios, sensibilidade cultural, ausência de raízes, medo e perdas, dificuldade em saber quem é, identidade escondida, inquietude, marginalização cultural, senso de pertencimento, visão de mundo e crenças.
Ou seja, são temas muito mais profundos e que, geralmente, é o que causam mais sofrimento e descontentamento para os brasileiros que estão vivendo em outro país.
Muitas vezes são esses os fatores que motivam o retorno precoce ao Brasil.

Entendendo o Iceberg da Identidade Cultural

Acredito que a parte visível do Iceberg é de conhecimento geral. Então, vou falar aqui de alguns aspectos da parte mais profunda e que pode ser novo para você, tudo bem?

Visão de mundo e crenças

Ao longo da nossa vida, vamos construindo nossa visão de mundo e as nossas crenças através das nossas experiências e ensinamentos que foram passados pelas pessoas, livros, cursos, entre outros. Quando nascemos e crescemos em um mesmo lugar, a visão de mundo que temos é daquele lugar e carregamos aspectos culturais de lá.
Da mesma forma acontece com as nossas crenças. Muito do que acreditamos e que passamos para frente, tem a ver com a cultura do país, do Estado, da cidade e até mesmo do bairro em que vivíamos. Isso pode ser desafiador quando nos confrontamos com visões de mundo e crenças diferentes das nossas.
Ao longo do tempo no novo país, é recomendável que tenha momentos para refletir sobre as suas crenças e a sua visão de mundo. À medida que você vai experimentando outras formas de viver, é possível agregar, eliminar ou substituir algumas crenças que tinha no passado e que fazem mais sentido no seu momento atual de vida.

Valores culturais e pessoais

Nossos comportamentos são guiados por aquilo que acreditamos ser importante em e para a nossa vida. Muitos dos nossos valores pessoais foram formados com base nos valores da sociedade em que vivemos. Por exemplo, a probabilidade das pessoas que vivem em países mais capitalistas, que valorizam o retorno financeiro, terem como um dos principais valores o dinheiro ou riqueza é maior do que para as pessoas que vivem em países socialistas.
Muitas vezes encontramos dificuldade quando os nossos valores pessoais são muito diversos dos valores culturais do país que escolhemos viver. Depois de um tempo, acabamos nos questionando o que realmente importa em nossas vidas e é importante revisitar nossos valores pessoais para atualizá-los. Esse ajuste faz com que a sensação de que estamos vivendo no piloto automático diminua. É como se ajustássemos a rota da nossa vida.

Adaptabilidade e sensibilidade cultural

O educador intercultural Milton Benett criou o modelo de sensibilidade cultural para explicar as reações das pessoas frente às diferenças culturais. O modelo é separado em 6 fases: a negação, a defesa, a minimização, a aceitação, a adaptação e a integração.

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  • Negação: as pessoas que estão nessa fase não veem diferenças culturais entre os países. Para eles, todos possuem os mesmos aspectos culturais;
  • Defesa: as pessoas veem as diferenças culturais, mas adotam posturas como se a própria cultura fosse melhor que a outra ou pior que a outra. Nessa fase, há julgamento de valor entre as culturas e comparação;
  • Minimização: aqui, as pessoas acreditam que, por todos serem seres humanos, as diferenças culturais não têm relevância. Eles minimizam os impactos das diferenças culturais.

Para Benett, as pessoas que estão em uma das três primeiras fases são as que sofrem mais com a adaptação ao novo país por não terem a sensibilidade cultural muito desenvolvida.

  • Aceitação: as pessoas nessa fase aceitam as diferenças culturais e as entendem. No entanto, se sentem inseguras para interagir com culturas diferentes;
  • Adaptação: conforme o tempo passa e há o convívio com a nova cultura, ela começa a enxergar de forma mais empática as diferenças culturais. Nessa fase, eles conseguem adaptar a sua forma de se relacionar e se comunicar com pessoas de diferentes culturas;
  • Integração: nesta fase, duas ou mais culturas já fazem parte da sua identidade e ela consegue se integrar nas duas ou mais culturas de forma natural.

Essas fases não são estáticas e você pode se desenvolver para se aproximar mais da fase da integração. Então pense e analise em que fase está, quais são os impactos disso no seu dia a dia e o que você deve fazer para se desenvolver.
Veja também o artigo que diz por que é tão difícil adaptar em outro país.

Ausência de raízes e senso de pertencimento

Nós, seres humanos, somos seres relacionais com necessidade de nos sentirmos pertencentes a um grupo. Isso tem a ver, também, com o sentimento de ter raízes em um lugar. Aprendemos a nos comportar perante a sociedade desde a infância e temos tempo para aprender, testar, nos rebelar e assimilar tais comportamentos para vivermos conforme as normas culturais.
Mudar de país pode ser um desafio
Mas, quando começamos a viver em outro país, temos que passar por todo esse caminho de uma vida inteira em dias e meses. Não sabemos muito bem o que fazer, o que pode ou não pode, o que é aceito ou não e ficamos meio perdidos no meio disso tudo. Se isso acontecer com você, tenha calma e paciência. Permita-se dar o tempo para que aprenda a conviver em uma nova cultura.
Formar um grupo de amigos brasileiros ajuda a se sentir mais pertencente, mas é necessário entrar em contato também com pessoas do país em que você está para aprender as regras culturais do país.

Dificuldade em saber quem é

Mudar de país é uma mudança de nós mesmos. Perdemos nossos referenciais, nos desconectamos de um sistema que já sabíamos como funcionava. No meio disso tudo, tentamos ligar os pontos novamente, tentamos nos reencontrar, mas muitas vezes é difícil.
Morar no exterior é um desconstruir para nos reconstruirmos e no meio do caminho, não reconhecemos mais quem somos.
Muitas vezes, é preciso de ajuda profissional para que possa entrar em contato com todas essas novas experiências, com os seus sentimentos, com a sua relação com a sua nova vida e, assim, se reorganizar. As descobertas feitas ao longo do caminho podem causar desconforto e dor, mas podem ser maravilhosas também.

Veja como lidar com os desafios da adaptação reversa ao voltar para o Brasil.

Marginalização cultural

Dependendo do país que for, pode ser que as pessoas estejam naquelas primeiras fases do modelo de sensibilidade cultural que mencionei anteriormente. Pode ser que elas tenham algumas crenças sobre as outras nacionalidades e acabem fazendo generalizações.
Não é raro vermos situações que envolvem preconceitos e racismo e, infelizmente, está longe dessas situações acabarem. Mas isso não é sinal de que devemos nos conformar. Se por um lado, podemos fazer a nossa parte para que o preconceito e o racismo seja cada vez menor, por outro, é fundamental trabalhar a autoconfiança e a valorização de quem somos.

Identidade escondida

O Brasil é um país cheio de misturas de nacionalidades e, quando estamos fora, muitas vezes as pessoas assumem que somos de outro lugar. Isso é mais comum em ambientes e situações em que as pessoas não têm a oportunidade de perguntar de onde somos. Para ficar mais claro, vou exemplificar com o meu caso.
Como sou descendente de japoneses, os espanhóis e os belgas não imaginam que sou do Brasil. Para eles, sou de alguma parte da Ásia. Minha identidade cultural brasileira fica escondida devido às minhas características físicas.

Por que morar no exterior não é para todo mundo? Entenda na coluna especial.

Lutos migratórios

Viver longe, em outro país, requer renúncias e perdas. Ao contrário do luto de quando um ente querido falece, em que sabemos que não o veremos mais, os lutos migratórios são lutos por pessoas, coisas e lugares que continuam lá, mas estão separados de nós pelo tempo e espaço. Temos que nos despedir de algo que ainda existe e isso pode gerar vários tipos de sentimentos, angústias e incertezas.
Nesses casos, é essencial que você tenha sempre em mente o porquê você resolveu mudar de país e quais foram os fatores motivadores da decisão. Assim, você minimiza as chances de romantizar a vida que você tinha no Brasil e de “demonizar” a vida que você tem no novo país.

Sentimentos migratórios

Morar em outro país é experimentar um turbilhão de emoções e sentimentos ambíguos ao mesmo tempo. Tudo bem se estiver se sentindo como em uma montanha-russa, você é normal. No entanto, é importante permitir-se sentir para ter mais consciência do que você está sentindo, o porquê de cada sentimento e seus gatilhos para conseguir gerenciar as emoções de forma saudável e não virarem uma depressão, por exemplo.
A rede de apoio ajuda muito para que você tenha com quem contar. E você também sempre pode contar com a ajuda de um profissional da área da saúde mental.
Adaptação à vida no exterior após os 65 anos: saiba tudo.

Preparação emocional é necessária

Há vários aspectos envolvidos na nossa identidade cultural, no nosso reconhecimento do eu vivendo em outro país. Conhecendo esses aspectos, fica mais fácil ter consciência do que está acontecendo com você e ser mais assertivo nas suas ações. Apesar da mudança de país ser um renascimento e um reencontro com nós mesmos, há muito do seu antigo eu que está aí, então lembre-se sempre das suas forças e virtudes!
Veja também como fazer o seu preparo emocional para mudar de país.