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Cesar Barroso

Colunista do Euro Dicas

Viagem de um aposentado brasileiro pela Europa: parte 2

Conteúdo criado por humano

O Erick Gutierrez, fundador do Euro Dicas, em seu simpático e inteligente e-mail de apresentação da primeira parte desta viagem, escreveu: “Deu bom! Mas também teve perrengue”. Sim, Erick, mas perrengue para valer só houve no dia em que eu saí de Alicante para Tallin, um dia que começou mal e terminou pior, a ponto de eu ter taxado 16 de junho de 2022 como “um dia como nenhum outro”.

Viagem de um aposentado a Tallinn
Índice Tallinn “Sou Tricolor de Coração...” Um dia como nenhum outro A chegada em Estocolmo não ajudou nada Chegar a Tallinn foi uma odisséia Enfim... Tallinn

Deixarei para o final deste artigo o relato dos acontecimentos. Veja agora o relato da segunda parte da viagem de um aposentado no verão da Europa.

Tallinn

Acordei tarde da minha primeira noite de sono em Tallin. “Noite” é força de expressão, pois em junho não há noite em Tallinn, apenas um leve escurecimento. “Aqui estou eu, sobrevivente”, pensei, “em Tallin, uma cidade que até há poucos meses eu não pensava em visitar”.

O plano inicial era vir sem marcar passagem de volta, pensando em passar uma semana em Tallinn e depois descer via terrestre pelos países bálticos, Latvia e Lituânia, até alcançar a Polônia, norte da Alemanha e Dinamarca. Imaginava que faria este tour em um mês e meio, talvez dois.

Centro da cidade de Tallinn
Praça principal do Centro Histórico de Tallinn. Foto de Cesar Barroso.

Aconteceu, porém, que fui levado a mudar de ideia e marcar passagem para o norte da Itália para dez dias após a minha chegada a Tallinn. Então, dividi ao meio esses dias no norte da Europa: cinco dias para Tallinn e cinco para Helsinque, que eu alcançaria por ferry, através do Mar Báltico. Quem sabe no ano que vem farei o que havia planejado para este ano…pensei.

A Estônia hoje em dia

Nada como colocar o pé no chão para começar a mudar a opinião sobre um lugar. Eu pensava que, por ter feito parte da União Soviética, a Estônia cortara todas as relações com a Rússia após a queda do muro.

A questão é que a vida das pessoas não segue a par e passo os acontecimentos políticos. Durante os anos comunistas, houve imigração intensa em ambas as direções, e hoje há muitas famílias russas que vivem na Estônia e vice-versa, as quais não querem voltar para os países de seus avós.

Os jovens consideram sua terra o lugar onde nasceram e estão crescendo e criando vínculos de amizade. Conservam as línguas de origem dentro de suas casas, mas fora de casa, são cidadãos estonianos ou russos. No geral, porém, os estonianos mantêm reserva quanto à Rússia, o que, convenhamos, é compreensível.

Quando perguntei ao Jakub (o estudante tcheco que dividia comigo o apartamento) onde havia um supermercado, ele respondeu; “tem uma feira diária e um supermercado russos logo ali adiante”. “Russos?”, eu perguntei admirado. “Sim, russos. As relações entre os dois países são seculares”.

Eu fui lá. Acho que, por razão da guerra e de eu estar levando a minha câmara fotográfica pendurada ao pescoço, não fui bem recebido. Uma feirante deixou claro, levantando e abaixando os braços atabalhoadamente, falando alto em russo, que não queria fotos ali.

casa em Tallinn
Casa tradicional em Kadriorg, em Tallinn. Foto de Cesar Barroso.

Saí rápido, não sem antes tirar umas poucas fotos, inclusive a de um caixote de castanhas-do-Pará vendidas a 20€ o quilo, e anunciadas como provenientes dos Estados Unidos! Deixo claro que admiro o povo russo por sua resiliência, sua literatura, sua música clássica, seu balé, mas, fazer amigos, não é o forte deles.

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Tallinn é diferente

Tallinn não é uma cidade do tipo a que estamos acostumados. O lindo centro histórico da cidade concentra bares e restaurantes. Fora dali, é difícil encontrar um bar ou restaurante, ou mesmo outros tipos de comércio.

Há shopping centers, mas todos os que eu vi estavam ao redor do centro da cidade. Diga-se de passagem, nem mesmo é uma cidade grande: tem pouco mais de 400 mil habitantes (como Porto e Gaia juntas). Coincidentemente, os preços dos alimentos nos supermercados e dos aluguéis são parecidos com os de Portugal.

Voltando ao centro da cidade: é lindo.

As ruas são calçadas com pedras, os palácios, mansões e igrejas são majestosos alguns enquanto outros parecem bibelôs. Vale ressaltar que, além da Rússia, a Suécia também governou a Estônia, e a Alemanha manteve empórios comerciais no país, todas por longos períodos.

Torres Medievais
Torres Medievais em Tallinn. Foto de Cesar Barroso.

Estes relacionamentos passados têm forte ingerência no presente da Estônia, o que ficou claro para mim na visita que fiz ao Museu de Arte KUMU, visita obrigatória para o turista que quer entender melhor a sociedade e as artes estonianas através dos tempos.

Sim, no centro da cidade estão as maiores atrações de Tallinn, mas eu gostei muito também de um parque enorme que abriga residências suntuosas, palácios, os museus e a praia, o Kadriorg. No Kadriorg estão, além do KUMU, um palácio que lembra o prédio do Museu Hermitage de São Petersburgo.

Ele foi construído por Pedro o Grande, czar da Rússia, há trezentos anos. O palácio abriga atualmente o Museu de Arte. Perto, está a casa de verão despretensiosa que Pedro o Grande construiu antes do palácio, o qual não habitou por ter morrido antes de sua conclusão.

Jardins do Museu de Arte
Jardins do Museu de Arte. Foto de Cesar Barroso.

A praia, no mar Báltico, é bonita, com areias brancas. Mulheres de bikini, algumas topless, se bronzeavam, à temperatura de 16ºC! Os jardins do Kadriorg estavam floridos, e mamães passeavam com seus bebês nos carrinhos. Acho que a Estônia não segue a tendência europeia de não ter filhos ou ter apenas um, pois nunca vi um lugar com tantos carrinhos de bebês pelas ruas.

Em suma, gostei muito da cidade, lamentei não ter passado ali no mínimo uma semana, e recomendo aos leitores do Euro Dicas que a visitem.

“Sou Tricolor de Coração…”

Estava eu caminhando em direção ao centro de Tallinn, quando cruzou por mim um homem jovem com o escudo do Fluminense na camisa. Voltei e cumprimentei:

-“Boa tarde, tricolor!”.

Ele abriu um sorriso enorme:

– “Também é tricolor?”.

Tomei coragem e declarei-me vascaíno. Rimos juntos.

O Fábio é dessas pessoas simpáticas que a gente tem logo vontade de travar conhecimento e continuar em contato. Dei-lhe o meu cartão, e em poucos dias recebi um e-mail com o assunto “Encontro Inusitado com Tricolor na Estônia”. Fábio é carioca, tem 41 anos e formou-se no Brasil.

Ciclistas em Tallinn
É verão e os ciclistas saem para passear em Tallinn. Foto de Cesar Barroso.

Eu não poderia perder a oportunidade de informar aos leitores do Euro Dicas as impressões do Fábio sobre como é morar em Tallinn. Mas antes ele fala da sua formação profissional e experiências:

Fiz o segundo grau técnico em Processamento de Dados, e ainda com 17 anos fiz vestibular para Análise de Sistemas, iniciei uma relação mais forte com TI e nunca mais larguei. A partir dali fiz diversos cursos de especialização, pós-graduação e MBA para me consolidar na carreira de Engenharia de Software.

Iniciei como estagiário de TI em 06/2000 em uma empresa de médio porte na área de comunicação. Aprendi um pouco sobre jornalismo, clipping e assessoria de imprensa, mas sempre aplicando tecnologia para dar suporte a essas áreas.

Ele permaneceu por 6 anos nessa empresa, saiu para uma nova oportunidade em uma fábrica de software com intuito de imergir ainda mais na área de desenvolvimento de sistemas. Depois migrou para grandes empresas em diversos segmentos, mas já tem alguns anos que tá trabalhando com TI no mercado financeiro, área em que atua até hoje.

A mulher de Fábio tinha um filho de quatro anos quando eles se conheceram. “Estabeleci com ele uma relação de pai/filho/amigo, a ponto de ele trocar o Flamengo pelo Fluminense. Agora, com 27 anos, ele nos fez avós. Nosso filho de 16 anos mora conosco aqui em Tallinn. Minha família é o meu suporte.”

Sobre imigrar, ele diz:

Sempre pensei um pouco, bem de leve, lá longe… mas, não era algo que tinha como meta, ou seja, eu não ficava procurando vaga fora do Brasil e, caso surgisse eu iria avaliar e tomar a decisão.

Como principais motivos acredito que os problemas no Brasil começaram a ficar mais gritantes de um modo geral, principalmente violência, alta de preços e desigualdade.

Quando a oportunidade surgiu, viram com bons olhos unir o útil ao agradável. Para o seu caçula tem sido uma ótima oportunidade para aprender novas culturas, estudar em escola europeia, ter essa vivência que é totalmente diferente do que ele estava acostumado. Eles acreditam que isso será um benefício muito grande para ele, principalmente para o seu futuro profissional.

Por que a Estônia?

Quando a oportunidade surgiu foi pra vir pra cá. Já havia recebido outras propostas como de Portugal, por exemplo, mas financeiramente não foram atraentes para valer a pena tamanha mudança. Por outro lado, a Estônia é considerada o “Vale do Silício” da Europa em termos de tecnologia.

Tudo aqui funciona muito bem e de forma eletrônica (e-pais). Logo, para nós que trabalhamos com TI, faz todo sentido. A sensação de segurança e a boa qualidade de vida associada ao trabalho são pontos fortes do país.

Eles não gostam do inverno rigoroso que toma quase metade do ano com muita neve e muito frio. E nestas horas é que a saudade do Brasil se torna enorme! Sentem falta de tudo e todos, principalmente dos familiares e amigos.

Gostam da cidade e da Europa em geral, mas ainda assim acham que o Brasil é o seu lugar. “Temos os nossos problemas como aqui eles também possuem os deles. São distintos, mas cada país possui seus prós e contras, temos que saber equilibrar para viver da melhor forma possível, seja qual for a escolha“.

O depoimento do Fábio poderá servir de incentivo e apoio para muitos leitores do Euro Dicas, eu acredito.

Um dia como nenhum outro

Pois é… acontecem certos dias… as mulheres americanas têm uma forma cômica para designar dias maus – “bad hair day” – um dia em que nada dá certo, como aqueles em que, por mais que elas façam, o cabelo não se ajeita. Pois o dia 16 de junho de 2022 ficará na minha história como um “bad hair day”.

As coisas incríveis que aconteceram nesse dia estão ligadas à viagem para Tallinn, com escala em Estocolmo, partindo de Alicante. Eu comprara a passagem com três semanas de antecedência numa agência online que utilizo há anos, a Cheapoair. Não me lembro se foi ou se não me foi oferecida a opção de adicionar no preço da passagem da Norwegian Air Shuttle a minha maleta (a mochila está incluída automaticamente no preço básico).

O espanto com o custo da bagagem

O certo é que, quando fui mais tarde verificar minha reserva no site da Norwegian, uma empresa de baixo custo, notei que eu teria que pagar 12€ extras pela maleta, por cada perna da viagem Alicante/Estocolmo/Tallin. Tentei pagar os 24€, mas não pude.

A informação é que teria que fazê-lo através da Cheapoair. Telefonei para a Cheapoair e eles disseram que teriam que pedir autorização à Norwegian para fazê-lo. Eles me deixaram esperando longo tempo ao telefone e voltaram com a informação de que não tinham conseguido falar com a empresa aérea.

Tentei no outro dia, e no outro dia também, até perceber que as duas empresas estavam me pondo na roda com o intuito de que eu pagasse 30€ por perna da viagem, que era o preço que a Norwegian cobrava no check-in no aeroporto. Fiz mais algumas tentativas mesmo sabendo que não conseguiria resultado. Este tipo de artimanha irrita a qualquer um.

O voo (ou quase)

Pois bem, o voo no dia 16, saía às 06:00h. Convenhamos que acordar às 02:40h não é um bom começo para o dia de ninguém. Um táxi previamente reservado me levou para o aeroporto. O salão de partidas estava na penumbra e algumas pessoas já esperavam sonolentas pela abertura do check-in.

Na hora que a atendente me cobrou os 60€, esperneei, disse que era um roubo, mostrei um diálogo online com a empresa que imprimi, pedi desconto, mas não houve jeito: tive que pagar os 60€.

Quando eu ia saindo com a maleta, a atendente disse que “maleta paga no aeroporto tem que ser despachada”. Esperneei mais uma vez, mas, de novo, não houve acordo. Lá foi a maleta na esteira. Comigo ficou apenas a mochila de fotografia.

Outro susto: esse foi maior ainda

Ao chegar no portão de embarque um estremecimento se apossou de mim. Tive que sentar para não cair: esquecera que na maleta estavam todos os meus cartões de crédito (menos um, que estava no bolso e com o qual eu pagara os malfadados 60€), cartão de saúde, carteira de motorista e 330€).

Fiquei aterrorizado por alguns minutos com a possibilidade do extravio da maleta, que eu nem recolheria em Estocolmo, mas em Tallinn.

Prédio em Tallinn
Tallinn também tem prédios muito modernos. Foto de Cesar Barroso.

Apliquei então a regra de ouro para essas situações: tomar uns goles de água, respirar fundo e silenciar a mente à espera do aparecimento de uma solução.

Como resolver?

Atrás do balcão do portão de embarque, meio escondidas, estavam duas funcionárias da Norwegian. Fiz uma cara de sofrimento e falei baixinho para uma delas que havia me esquecido na maleta um remédio que eu precisava tomar sem falta durante o voo, caso contrário eu poderia ter um pico de pressão.

Ela perguntou se eu realmente precisava tomar o remédio, e respondi que era imprescindível. Pelo rádio, ela entrou em contato com o chefe de pista e pediu minha maleta. Agradeci muito e minha ansiedade diminuiu.

Mas, começou o embarque, e nada da maleta chegar. Finalmente fui chamado por um senhor sorridente de macacão que me levou à porta do avião, onde estava a maleta. Tirei a pochete e lhe disse que ali estava um remédio. Ele sorriu e levou a maleta de volta para o compartimento de carga.

Resumo do dia

O jogo estava um a um, mas a partida apenas começava, e o gol do adversário me deixara abalado. Sentei, fechei os olhos, e só acordei em Estocolmo, às 10:00h. O voo para Tallinn sairia dez horas depois.

A chegada em Estocolmo não ajudou nada

Me esperava na saída do avião um conhecido de outras paragens e que agora morava há uns dez anos em Estocolmo. Não darei detalhes, embora eu esteja seguro que estas linhas não chegarão até ele, que nem lê português. Levei da Espanha uma caixa de bombons para ele e família.

Como havia uma espera de dez horas, eu contava que ele me desse dicas de como chegar até o centro da cidade para um tour, ou mesmo que me levasse em seu carro e eu lhe convidaria para o almoço.

Mas não foi bem assim…

Depois de deixar claro que tinha pouco tempo para mim, tudo o que ele fez foi me desencorajar. Levou-me para comprar um ticket de um tal de Arlanda Express, um trem que em 18 minutos me deixaria no centro da cidade, mas cuja passagem de ida e volta custava 55 dólares.

Eu disse que não pagaria aquela quantia ridícula. Perguntei por uma alternativa, mas ele disse que seria melhor eu ficar no aeroporto, pois na volta poderia encontrar uma fila de “quatro horas e meia” para passar pela segurança. Assustei-me. E após este susto, ele me deu ciao e desapareceu na multidão.

Resignei-me, então, a ficar no aeroporto. Teria a vantagem de eu não me cansar muito, pensei. Foi um erro.

A espera infinita no aeroporto

Aeroportos são lugares estressantes, e o de Estocolmo não é exceção. Milhares de pessoas entravam e saiam, nenhuma de máscara, eu usava a minha máscara. Deu fome, pois a bordo não se serviu nada, e eu não havia jantado no dia anterior por causa de uma pequena indisposição intestinal (segundo o motorista do táxi de Alicante, não se deve beber da água das torneiras de lá).

Entrei numa pizzaria. Um breve papo com o pizzaiolo italiano Ângelo foi o suficiente para a preparação de uma Margherita caprichada, ao preço de 140 coroas suecas, cerca de 14€. Elogiei a pizza e fiz o Ângelo começar o dia feliz.

Passageiros e bagagens

A partir daí, foi um desgaste. Sentava aqui, sentava ali, o tempo não passava. Entrava a saía gente aos borbotões. Vi desfilarem diante de mim milhares de suecos, de todas as tribos vikings havidas e por haver.

Gente nova, gente velha, quase todos louros. O meu voo para Tallinn estava no telão desde cedo, com saída prevista no Portão 16. Eu entrava nas mesmas lojas várias vezes, num processo neurotizante.

Mas nem tudo é ruim…

Por volta das 16:00h, tive uns momentos de alívio. Sentei-me ao lado de dois casais com complexão física do Oriente Médio, na faixa de idade de cinquenta e tantos, acompanhados de seis jovens na faixa de idade entre 17 e 23, eu imaginei. Falavam uma língua estranha, que ora parecia árabe, ora uma língua escandinava.

Tomei coragem e me dirigi a uma das jovens, receoso de que fossem de alguma cultura em que estranhos não podem se dirigir a mulheres. Ela parecia esperar a minha aproximação. Perguntei-lhe que língua falavam. “Falamos uma mistura de sueco e aramaico.. Aramaico era a língua que Jesus falava.”

E como vieram parar na Suécia, perguntei.

Não temos país, e nossos pais ainda jovens foram recebidos na Suécia como refugiados. Vivemos numa cidadezinha onde formamos uma comunidade. Nós, jovens, criamos nossa língua misturando aramaico com sueco. Eu acabo de me formar em direito. Quero através do meu trabalho devolver a este país, à sociedade sueca, tudo de bom que nos tem dado.

Eu admirava a mentalidade daquela morena que aliava à beleza física o sentido de responsabilidade social. Ia pedir para fotografá-la, mas poderia ser tomado como um abuso pelos seus pais.

Perguntou-me para onde eu ia. Ela disse que conhecia Tallinn e que certamente eu gostaria de lá. Devolvi-lhe a pergunta, e me disse que iam passar férias na ilha grega de Corfu. Perguntei-lhe se tinha visto a série televisiva inglesa “The Durrells in Corfu” e me respondeu que sim. Estava na hora de seu voo. “Espero que tenham umas belas férias”, eu disse.

Chegar a Tallinn foi uma odisséia

A partir daí, eu não via mais a hora de entrar naquele avião da Norwegian e partir. Olhei de novo o telão: lá estava o Portão 16 confirmado.

Duas horas antes da partida do voo, comi um sanduíche com café com leite, e me dirigi para as imediações do Portão 16. As pessoas foram chegando, formou-se uma aglomeração e depois uma fila. Foram chamados os grupos para embarque. O meu era o último. Coloquei o código de barras do cartão de embarque debaixo do leitor, e foi rejeitado.

O que aconteceu? A atendente pediu para ver o cartão. “Este voo não é para Tallinn, é para Oslo. O portão de embarque do voo de Tallinn foi mudado”. Aflito, perguntei qual era o novo portão. “É o 14”, ela respondeu. Corri para o 14. O voo já havia partido.

Um momento de desespero, sim

Pela primeira vez em minha vida adulta eu tive vontade de sentar no assoalho, esmurrar o chão e chorar aos berros. Minha autoestima baixou a zero, e eu olhava ao redor para ver ser alguém tinha pena de mim.

Algum tempo se passou, não sei quanto, até eu aplicar pela segunda vez num dia a regra de ouro. Sentei, fechei os olhos, tomei um gole de água e esperei uma solução, que veio aos poucos: eu não dormiria numa cadeira daquele aeroporto de jeito nenhum; eu não telefonaria para aquela pessoa pedindo ajuda de jeito nenhum; eu chegaria a Tallinn naquela noite de qualquer maneira, nem que fosse no ferry da meia-noite.

Dirigi-me ao fatídico telão de partidas. Um último voo para Tallinn, da SAS, sairia dentro de quarenta minutos. E a maleta? O protocolo manda que sejam retiradas do avião as maletas de passageiros que não embarcaram. Corri para o local das esteiras das malas. Jogada num canto, lá estava a maleta.

Avião da empresa SAS
Foi o último voo da SAS que me levou de volta a Tallinn.

Corri à procura do balcão da SAS. Uma senhora idosa me atendeu: “Temos só um lugar no avião”, ela disse. Mandei emitir o ticket sem perguntar quando era. Eu pagaria qualquer dinheiro para ir embora, mas na hora em que eu vi a conta, doeu: US$330.00.

Isto mesmo, US$330,00 para um voo de uma hora na última cadeira de um avião pequenininho. Saí correndo para o portão de embarque, com o coração saindo pela boca.

A aeromoça adivinhou a minha odisseia e trouxe-me água e café, assim que sentei. “É por conta da casa”. Sorri e agradeci, achando que por conta dos 330 dólares eu mereceria também um cafuné que me fizesse dormir.

Enfim… Tallinn

O pequeno aeroporto de Tallinn estava vazio. Meus olhos liam no celular o número do bonde que eu teria que pegar até o apartamento Airbnb, mas meus neurônios negavam conexão. O bonde era o #4 mas os neurônios repetiam que era o #5.

Perguntei em espanhol a uma senhora se para a Tartu Maantee era o bonde #4 ou #5. Para meu espanto, ela respondeu em espanhol (ou será que foi uma alucinação?). que era o #4. Jakub teve que me buscar na parada do bonde porque eu já não tinha forças para mais nada, muito menos para encontrar um número na entrada de um prédio.

Tomei um banho, caí na cama, fechei os olhos e pensei: “Cesar, não se culpe pelo que aconteceu. Há dias e dias. Durma sossegado. Amanhã você acordará em Tallinn”.

Veja a coluna em que relato a preparação e a primeira parte da minha viagem.

*As opiniões dos colunistas não refletem necessariamente a opinião do site Euro Dicas.

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Cesar Barroso

Jornalista, fotógrafo comercial e de arte, viajante, leitor ávido, autor de "Quatorze Dias em Portugal" e "South Beach on Foot", cozinheiro amador, praticante de ioga e meditação zazen, ficcionista. Pode ser encontrado no Instagram @cesar_barroso.

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