Quando você é brasileiro e vai morar em outro país, num primeiro momento, começa a lidar com as barreiras do novo idioma. Acontece com todo mundo, mesmo com quem é fluente em outras línguas. Depois, à medida que você vai se ambientando e aprendendo novas palavras e expressões, você percebe duas coisas:

  1. O quanto a nossa língua materna é riquíssima;
  2. Como ela pode ser intraduzível em determinadas situações.

Além disso, você começa a descobrir uma série de curiosidades sobre as diferenças dos idiomas e a respeito de si próprio que não teria como saber antes de sair do seu país de origem.

Eu sou uma brasileira vivendo na Itália há quase dois anos e, neste artigo, eu vou te contar um pouco do que eu já vivi e descobri por aqui. Vem comigo que eu te conto no caminho!

Um italiano todo baseado em telenovelas brasileiras

Quando eu cheguei na Itália, eu pensei que sabia falar um pouquinho de italiano. Ledo engano! Acho que essa é uma ilusão que a maioria de nós herdou das telenovelas que fizeram um sucesso estrondoso dos anos noventa.

Mas eu não demorei a perceber que:

1. tanto o italiano falado era diferente e bem mais difícil de compreender quanto

2. o meu italiano “Terra Nostra” não era assim tão compreensível para os italianos, porque ficar metendo “are” no final de todas as palavras como eles faziam na novela não era assim tão eficiente quanto eu pensava.

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3. se eu quisesse aprender mesmo, eu teria que começar a estudar.

E foi o que eu fiz. Na primeira semana eu já estava matriculada numa escola gratuita para imigrantes e foi lá que eu aprendi o básico pra começar a me virar aqui.

O melhor dos mundos é vir pra cá já tendo uma noção básica da língua, de preferência, começar a estudar antes. Esse é sempre o ideal: se preparar com antecedência. Mas se esse não for o seu caso (como não foi o meu), é possível aprender no dia a dia.

“Italianol”?

Só esteja preparado para um fenômeno curioso que acontece com a maioria dos brasileiros recém-chegados na Itália que não dominam a língua:

Quando você começa a tentar se comunicar em italiano, seu cérebro fica um tanto atordoado e, do nada, você começa a balbuciar em espanhol.

Lembro que eu me questionava:

“mas por que essas palavras estão saindo em espanhol se eu nem sei falar essa língua direito?”.

E eu reparei o mesmo fenômeno acontecendo com todos os meus amigos que chegaram aqui sem falar italiano depois de mim.

Isso acontece porque o espanhol é a língua latina mais próxima da nossa e com a qual temos mais contato. Então, naturalmente, é a ela que automaticamente recorremos quando estamos em território estrangeiro.

O brasileiro recém-chegado no país da bota tentando se comunicar é uma mistura mutcho loka de tudo que aprendeu em Terra Nostra com uma pitada de La Casa de Papel, gesticulando com a mão o tempo inteiro.

E o melhor de tudo é que, pro básico, acaba funcionando, porque o povo italiano, quando percebe que a gente tá se esforçando pra aprender a sua língua, é super receptivo e amigável, embora muitos ainda achem que a nossa língua mãe é a espanhola. Mas não dá pra julgá-los, não é mesmo?

Speak English?

Não obstante a confusão mental que o nosso cérebro se encontra nesses primeiros momentos, tem outra coisa que você precisa estar preparado quando se dispõe a viver em terras italianas: exceto nas grandes cidades e nas mais turísticas, a língua inglesa quase não é falada.

Portanto, é provável que se você tentar recorrer ao inglês para te auxiliar, nem sempre vai obter sucesso.

A Itália, como bem sabemos, mantém suas tradições fortemente enraizadas. E, embora a língua italiana seja falada somente aqui – talvez justamente por isso -, é preservada com muito orgulho.

Prepare-se para conhecer sua nova personalidade

Agora que eu já falei das dificuldades e dos perrengues, vem a parte interessante e, eu diria, até poética.

Fugindo um pouco do lugar comum, porque acredito que a língua italiana seja apreciada por grande parte das pessoas por ser intensa e passional. O processo de aprendizagem – independentemente do grau de dificuldade de cada um – acaba sendo muito prazeroso.

O interessante é que mesmo uma pessoa mais introvertida, começa a descortinar uma “nova personalidade” quando começa a falar italiano porque é praticamente impossível se expressar sem colocar emoção e aumentar a entonação na fala.

Falo da minha vivência aprendendo italiano em terras italianas, mas isso se aplica para qualquer pessoa que se aventura a fazer o mesmo em outros países. Sempre somos pessoas diferentes em outras linguagens. Falar uma língua estrangeira é, por si só, entrar em um novo universo.

O desejo de aprender uma nova língua guarda o desejo implícito de habitar uma nova linguagem, de encontrar uma chave para abrir uma porta fechada e, atrás dessa porta, descobrir uma nova paisagem, um mundo desconhecido e, dentro desse mundo, está você.

Uma versão sua que você ainda não conhecia e vai ter a chance de descobrir, aos pouquinhos, como se move por esse mundo recém-descoberto.

Leia também o meu relato sobre o imigrante ser um eterno estrangeiro.

As delícias da língua materna

Falar uma língua estrangeira é, também, se apropriar, cada vez mais, da sua língua nativa. Aqui eu arrisco ir um pouco além: ouso dizer que quanto mais você domina outra língua, mais você se apaixona pela língua portuguesa.

À medida que eu aprendo a falar italiano, embora eu continue encantada com o idioma, eu ganho um pouquinho mais de propriedade para fazer comparações com a minha língua nativa.

Mergulhar em um novo idioma tem me permitido, em paralelo, mergulhar mais fundo no meu idioma e alcançar uma compreensão, antes velada, da qualidade e singularidade da minha própria língua.

Não deixe de conferir nosso guia com séries italianas imperdíveis para adicionar à sua lista!

Expressões intraduzíveis

Um exemplo simples e banal, mas muito simbólico pra mim, foi o que aconteceu durante um encontro de amigos onde a maioria era brasileiro e alguns poucos italianos. Naquela ocasião, depois de algumas taças de vinho, um de nós soltou a expressão “Torta de climão”. Exceto os italianos, todos gargalharam.

Depois passamos meia hora tentando explicar a graça daquela “piada” pra eles. Sem sucesso, obviamente. Existem expressões que são muito nossas, que só fazem sentido pra gente.

E é nesses momentos, quando eu me pego observando os contornos da nossa linguagem (ou do nosso dialeto, por que não?), ou quando estou tentando traduzir uma palavra ou expressão da língua portuguesa que ela acaba se revelando com uma beleza nova pra mim.

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Explicar qualquer uma dessas frases para um estrangeiro é uma missão quase impossível.

Além disso, no português, existem palavras muito simples e que no italiano são bem mais complicadas. A Giulia Di Silvestro é uma italiana que vive em São Paulo há mais de sete anos e faz vídeos divertidíssimos. Neste, ela dá três exemplos ótimos.

Giulia é professora de italiano e é uma apaixonada pela língua portuguesa. E eu sou uma apaixonada pelo conteúdo que a Giulia produz, mas, pra mim, ela se superou aqui, quando tentou explicar as expressões “tocando o terror” e a famosa “torta de climão”.

E, pra fechar com chave de ouro, deixo aqui um dos vídeos da série “Traumatizando gringos aprendendo português” que o talentoso Marcos Eni vem produzindo no seu canal, que exemplifica a diversidade da nossa língua esbanjando bom humor.

Também escrevi sobre: viver fora é como um casamento.