Esse ano interrompo, mais uma vez, a docência para me dedicar à pós-graduação e à pesquisa. Um ciclo que se encerra. Mas foi olhando para trás que decidi contar um pouco de como é dar aulas na Itália.

Dar aulas na Itália de língua portuguesa

Ensinar a sua língua para pessoas que estão interessadas em conhecê-la a fundo é uma emoção única. Parece pouca coisa, mas para mim, que estudei a língua dos meus alunos, inverter esse papel foi uma experiência muito interessante.

Quando comecei a dar aulas na Itália?

Durante os anos em que estava no Mestrado, tive alguns alunos particulares de italiano online. Até que uma amiga – e hoje também colega de profissão – perguntou se eu não gostaria de substituí-la. Ela ensina português para estrangeiros em Perúgia, e foi assim, de modo casual e esporádico, que comecei a dar aulas na Itália.

Mas não comecei dando aulas na universidade. Em um primeiro momento, foi igual a fazê-lo no Brasil. Aula particular, “one to one”, preço por hora/aula. A única diferença é que eu estava ensinando a minha língua para pessoas que não a conheciam.

Nesses casos, a vantagem de ter estudado italiano no ensino superior foi evidente. Eu já sabia falar italiano, já morava na Itália e, sendo ex-aluna (ou melhor, eterna aluna!) de italiano, a troca sobre as dificuldades da língua portuguesa era interessante, porque conseguia entender o ponto de vista do aluno.

E na universidade?

Já no centro de línguas comecei durante a pandemia, em 2021. Me inscrevi num edital para professor de língua portuguesa como língua estrangeira na Universidade de Perúgia, instituição em que cursei e defendi o Mestrado na Itália um ano antes, e passei. Dei aulas para os cursos de graduação (laurea triennale) e mestrado (laurea magistrale).

Como é ser professora no país?

Dar aulas na Itália foi enriquecedor, apesar de todos os problemas burocráticos e de corte de verbas que as universidades italianas vêm enfrentando, principalmente no setor das humanidades.

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Por outro lado, os alunos se interessam muito pelo Brasil, há uma troca intercultural muito grande. Há não muito tempo, era eu quem estava sentada na carteira da faculdade aprendendo uma língua estrangeira (italiano) com professoras nativas. Então, ter tido a oportunidade de vivenciar essa troca de papéis e de lugares foi engrandecedor.

Houve choque cultural?

Na verdade, não. Como conto sempre nas minhas colunas, a sociedade italiana tende a ser mais formal do que a nossa. Principalmente em lugares públicos, como órgãos oficiais.

Na universidade não é diferente. Os alunos, por exemplo, sempre usaram a forma de cortesia “Lei“, e nunca “Tu“, comigo. Se falavam em português, usavam “você” sem problemas, mas em italiano jamais. Ou até mesmo colegas mais velhos, ou funcionários da universidade: a escolha é pelo título,”Dottoressa“.

Isso porque existe uma distância entre o professor e o aluno, e não utilizar o modo formal é falta de respeito. No começo era um pouco estranho e quase artificial, já que eram alunos pouco mais novos do que eu. Mas acabei me acostumando.

Como é ser professora na Itália
A poeta Maria Borio e eu, durante o Congresso Intercontinental Modernismo brasileiro, em 2022. Foto: arquivo pessoal.

Momento confissão: português europeu

A parte desafiadora de dar aulas na Itália era ensinar também a norma europeia. Sim, é a mesma língua, porém me resultava um pouquinho “artificial” explicar alguns casos muito comuns em Portugal, como a regra do imperativo direto conjugado na segunda pessoa (por exemplo, Lava-te!).

Isso porque a universidade incentiva o ensino do português europeu e do português brasileiro. Porém, o que no começo parecia difícil e estranho, no fim, acabou me incentivando a estudar melhor os pontos em que as duas variantes não se cruzavam. Sem dúvidas, as aulas foram mais interessantes e menos superficiais.

Confesso ter trabalhado com outras variantes, como angolana e moçambicana, mas pouco. Acreditem quando um professor diz que não tem tempo para seguir o conteúdo programático. É verdade!

Perfil dos meus alunos

Italianos e italianas, jovens!

Como dava aula no centro de línguas da universidade, os alunos vinham principalmente do curso de Línguas estrangeiras. Isso porque, em algumas universidades, os alunos precisam fazer algumas horas no centro linguístico e outras no departamento, com professores doutores.

A ideia é você praticar a língua com professores nativos. Mas para poder fazer os exames finais, os alunos precisam, primeiro, terem passado nas provas de língua estrangeira no centro linguístico.

Graduação e mestrado em línguas estrangeiras

Aqui na Itália, se você estuda línguas estrangeiras, você não se matricula em Letras. O nome do curso é “Lingue e culture straniere“. Normalmente, você escolhe duas ou três línguas para estudar, e se especializa em duas. As combinações são muitas, e é o aluno quem decide o que estudar.

Grosso modo, meus ex-alunos estudavam português e espanhol ou inglês ou francês. Alguns estudavam também português e russo, ou ainda português e chinês (mandarim). A escolha também depende da oferta de cada departamento e, principalmente, do horário das aulas, já que por serem muitas, acabam-se criando conflitos na grade horária. Porém, na maioria dos cursos, a frequência não é obrigatória.

Aulas de literatura lusófona

Além das aulas de línguas, os alunos também precisam cursar literatura. Ouvir desses alunos uma interpretação de uma poesia do Drummond ou de um romance do Jorge Amado (além, claro, de autores portugueses) é uma experiência única.

A nossa literatura é de uma qualidade e riqueza altíssimas. Como leitora assídua, entendo e compartilho da emoção que esses jovens alunos sentem ao ler as obras em língua original (no caso, na nossa!).

Inclusive, acho que esse é a principal diferença entre ensinar português na universidade e como curso livre. Você tem obrigações que vão além da competência na língua estrangeira, ou de um objetivo final. A graduação é um percurso universitário, que forma o aluno a 360 graus, para que este possa virar professor, tradutor, intérprete, entre outros.

Dar aulas na Itália ensinando português
A minha querida ex-aluna Silvia Mihajloski no Centro linguístico Ateneo da Universidade de Perúgia. Foto: arquivo pessoal.

Ensinar é se manter atualizado

Um jeito que encontrei de me manter atualizada sobre o que estava acontecendo no Brasil foi trabalhar com materiais autênticos (feito por brasileiros para brasileiros, em português, como artigos de jornais ou vídeos no YouTube).

Como meu Mestrado foi em Comunicação política (e o doutorado segue mais ou menos a mesma linha de pesquisa), eu tentava trabalhar com a língua passando pelos meios de comunicação e, principalmente, redes sociais. Teve até tarefa com TikTok… O resultado foi incrível!

E o curso de Letras?

Se, por outro lado, você estiver interessado em estudar italiano (como língua nativa), latim e grego, filologia e literatura clássica ou moderna, você precisa se matricular em “Lettere classiche” ou “Lettere moderne“.

Assim como no curso de Letras Português no Brasil você não aprende português, em Lettere é o mesmo, você não aprenderá italiano, já que o estudo da língua é feito pela ótica dos professores, alunos e estudiosos em geral nativos de italiano.

Leia também minha experiência viajando sozinha na Itália.

Já dava aulas no Brasil?

Sim.

Eu comecei a dar aulas de italiano em 2013, há exatos dez anos! Decidi trabalhar numa escola de idiomas para aprender a dar aulas e, principalmente, a melhorar o meu italiano. Afinal, as dúvidas que os alunos têm, em sala de aula, são ótimos momentos de reflexão posterior às aulas.

Na época, era aluna de Letras – Português e Italiano, estava no quarto ano do curso (e no terceiro da habilitação, o bacharelado dura 5 anos, mas o primeiro é chamado “ciclo básico”, onde todos os “calouros” fazem as mesmas matérias).

Eu sempre quis ser professora, sempre gostei da ideia de entrar em sala de aula, e até hoje, se estou em um contexto universitário, não tenho vergonha de falar em público.

Grupo de professores na Itália
Ex-colegas em Perúgia, professores de língua, literatura e cultura lusófona. Foto: arquivo pessoal.

Fui professora em tempo integral até 2017, ano em que me mudei para a Itália. O ano anterior tinha sido decisivo em minha vida. Um ano de mudanças e tomadas de decisões. Com a mudança de país, parei de dar aulas, não conseguia encontrar a vontade de trabalhar como professora, quanto menos online.

Tudo que é bom chega ao fim

Como antecipei acima, não dou mais aulas de língua portuguesa, pelo menos por enquanto. Foram três anos fascinantes e divertidos, e também um pouco estressantes (principalmente no fim do semestre!).

Atualmente, alguns ex-alunos estão fazendo intercâmbio na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, onde me formei. Imaginem a minha emoção. Gosto de pensar que tive uma certa influência em suas escolhas. Afinal, boa parte dos alunos de língua portuguesa escolhem Portugal para realizar o Erasmus+, e esses jovens corajosos decidiram cruzar o Atlântico para se aventurar na quinta maior cidade do mundo. Complimenti!