Depois da obtenção, aparentemente ilegal, da cidadania portuguesa por origem sefardita pelo oligarca russo Romam Abramovich, o governo português anunciou que vai endurecer as regras do processo.

Confira nesse artigo o que foi o caso Abramovich, o que muda no regulamento da lei que concede cidadania portuguesa a descendentes de judeus sefarditas e quando essas mudanças serão aplicadas.

O que foi o caso Abramovich e sua repercussão

Em abril de 2021, o oligarca russo Roman Abramovich obteve, em um processo cheio de inconsistências, a nacionalidade portuguesa para descendentes de judeus sefarditas.

O caso veio à tona no início de 2022, quando a Rússia invadiu a Ucrânia, Abramovich e outros aliados de Vladimir Putin começaram a sofrer sanções e passar por investigações.

O processo dele foi rápido demais

A primeira suspeita recaiu sobre a duração do processo: o russo obteve a cidadania em apenas seis meses e normalmente são necessários dois anos para obtenção do passaporte português por essa via.

Falhas na documentação

O processo apresenta falhas na comprovação documental que Abramovich possui ligação genealógica com judeus sefarditas. Há uma forte suspeita de que os documentos foram falsificados para forjar um vínculo inexistente.

O oligarca russo tem origem lituana, seu sobrenome e ascendentes apontam para que ele descenda de judeus procedentes das regiões central e oriental da Europa. Sendo assim, ele não teria direito à cidadania portuguesa.

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O envolvimento de Daniel Litvak

Uma investigação feita pelo jornal Público mostrou que a Comunidade Israelita do Porto (CIP), responsável pelo reconhecimento do vínculo sefardita no processo de Abramovich, recebeu uma grande doação do oligarca para construção do Museu do Holocausto do Porto.

Ainda segundo o Público, o rabino Daniel Litvak, responsável certificação na CIP, teria mais de três milhões de euros em contas em Portugal e no exterior, quantia incompatível com os rendimentos do religioso.

Após investigação da Polícia Judiciária portuguesa, Litvak foi preso sob acusação de tráfico de influência, corrupção ativa, falsificação de documentos, lavagem de dinheiro, fraude fiscal e associação criminosa. O religioso, que foi liberado posteriormente, é acusado ter emitido documentos falsos no caso de Abramovich e em outros processos, o que teria permitido a obtenção irregular da cidadania por pessoas que não têm ascendência judaica sefardita.

Como resposta ao escândalo, o governo português endureceu a lei de concessão de cidadania por via sefardita, aumentando as exigências aos requerentes. Já a CIP anunciou que iria suspender imediatamente a emissão de certificados de comunidade judaica a novos requerentes.

O que é a naturalização via sefardita em Portugal?

Em 2015, Portugal, por meio da Lei Orgânica nº 1/2013, de 29 de julho e do Decreto-Lei 30-A/2015, de 27 de fevereiro, passou a conferir o direito à cidadania portuguesa aos descendentes de judeus sefarditas que comprovem essa ligação por meio de documentos.

Essa lei surge como uma reparação histórica aos descendentes de judeus que, a partir do final do século XV, passaram a ser perseguidos pela Inquisição, sendo forçados à conversão ao catolicismo. Muitos deles fugiram para o Brasil e para outros países da América, como Argentina e Estados Unidos.

Quais são as etapas do processo de naturalização?

O processo de naturalização ocorre em duas etapas:

  1. Solicitação do certificado, junto à comunidade judaica;
  2. Solicitação da cidadania, junto à conservatória do governo português.

Solicitação do certificado da comunidade judaica

O primeiro passo do requerente é comprovar que descende de uma comunidade sefardita de origem portuguesa. Isso é feito por meio de um certificado de comunidade judaica, emitido por uma comunidade judaica portuguesa com estatuto de pessoa coletiva religiosa.

Em Portugal, duas instituições estão autorizadas a emitir esse documento: a Comunidade Israelita de Lisboa (CIL) e a Comunidade Israelita do Porto (CIP).

Deve-se apresentar, por meio de um formulário, à Comunidade Israelita:

  • Dados e documentos do requerente: nome completo, data de nascimento, naturalidade, nacionalidade, comprovantes de residência e filiação;
  • Indicação da descendência a partir da comunidade sefardita de origem portuguesa (acompanhado de elementos de prova).

O requerente deve indicar todas as gerações (por meio de uma árvore genealógica) e apresentar provas documentais (certidão de nascimento, casamento ou outra) para cada geração. Muitas vezes, para fazer esse levantamento, é necessário contar com o apoio de historiadores e genealogistas.

A Comunidade Israelita irá analisar a documentação e emitir, ou não, um certificado que atesta que o requerente realmente é descendente de um judeu sefardita.

Caso Abramovich: Escriba escrevendo uma Torá

É possível comprovar a ascendência sefardita sem o certificado, por meio de certificados de outras comunidades judaicas ou documentos comprobatórios autenticados. Porém, o meio mais recomendado de comprovação é certificado emitido pela CIP ou CIL.

Solicitação da cidadania portuguesa na conservatória

Após o recebimento do certificado da comunidade judaica, o interessado deve enviar um requerimento de nacionalidade ao Ministério da Justiça. Esse pedido deve ser submetido, pelo envio de documentos, a uma das conservatórias do Instituto dos Registos e Notariado (IRN) ou no consulado português da região onde vive o requerente.

O requerente deve apresentar os seguintes documentos:

  • Certificado da comunidade judaica;
  • Certidão de nascimento;
  • Atestado de antecedentes criminais (de todos os países que o requerente viveu nos últimos cinco anos);
  • Formulário de requerimento.

Os documentos emitidos fora de Portugal devem possuir Apostila de Haia e, se estiverem em outro idioma, devem ser traduzidos por um tradutor juramentado.

Apenas pessoas maiores de 18 anos podem requerer a nacionalidade por via sefardita. Caso o requerente tenha filhos menores de idade estes também terão direito à nacionalidade portuguesa, porém esta deve ser solicitada após o reconhecimento da nacionalidade portuguesa dos seus pais.

É vedada a nacionalização de cidadãos que tenham sido condenados por um crime que em Portugal seja passível de prisão por três anos ou mais e para aqueles envolvidos em atividades relacionadas ao terrorismo.

Quanto custa o processo?

No mínimo, 500€. As Comunidades Israelita do Porto e de Lisboa exigem um donativo de 250€ para efetuar a análise do vínculo sefardita. A conservatória cobra uma taxa de 250€ para a análise do requerimento de nacionalidade.

Há de se considerar também possíveis gastos com a investigação da árvore genealógica, busca de certidões em Portugal e em outros países, apostilamento e tradução juramentada de documentos.

Quanto tempo demora o processo?

Não é possível prever a duração exata do processo, pois nem as Comunidades Israelitas nem o governo português estipulam prazos máximos para seus trâmites.

Geralmente, as Comunidades Israelitas demoram seis meses para dar o seu parecer. O governo português costuma demorar entre um e dois anos para publicar a decisão, após o envio dos documentos. O prazo junto à conservatória pode ser reduzido, caso o requerente já more em Portugal e, neste caso, pode solicitar urgência.

O que mudou na Lei de Nacionalidade?

Em 18 de março de 2022, foram publicadas alterações no regulamento de concessão da nacionalidade portuguesa, visando trazer mais transparência ao processo e evitar fraudes. Há mudanças tanto nas exigências para a emissão do certificado da comunidade judaica quanto para a concessão da cidadania pela conservatória.

Uma mão segura um passaporte português e uma placa de madeira ao fundo

Os certificados da comunidade judaica passam a ser padronizados e é obrigatório que se indique as provas utilizadas para comprovar o vínculo entre o requerente e o judeu sefardita. Antes, um documento onde o rabino atestasse tal ligação, sem a listagem dos meios de prova, era suficiente.

A conservatória passa a exigir, além dos documentos acima, uma “comprovação de ligação efetiva e duradoura à comunidade portuguesa”. Segundo a publicação do governo português, essa ligação pode ser comprovada pela propriedade de imóveis, participação societária em uma empresa portuguesa ou por meio de viagens regulares ao país.

Quando entram em vigor essas novas regras?

Para as comunidades israelitas, as alterações passam a valer em 15 de abril de 2022. Ou seja, os certificados expedidos a partir dessa data precisam seguir a nova regulamentação. Para o requerente não muda nada em 15 de abril, já que os documentos exigidos pelas comunidades israelitas continuam os mesmos.

Para a concessão da cidadania portuguesa, ou seja, na fase da conservatória, as mudanças entram em vigor em dia 1º setembro de 2022. Os requerentes que derem entrada na conservatória até 31 de agosto de 2022 seguirão as exigências do regulamento atual.

A partir de 1º setembro de 2022, os processos seguem as novas regras e o requerente precisa comprovar vínculo efetivo e duradouro com Portugal.

Essa mudança afeta quem obteve a cidadania por via sefardita?

Não. Quem já obteve a nacionalidade tem o seu direito garantido. A cidadania não pode ser “cancelada” por essa mudança na legislação.

Essa mudança afeta quem teve o Certificado emitido pela CIP?

Não. Os certificados de origem sefardita já emitidos pela Comunidade Israelita do Porto e pela Comunidade Israelita de Lisboa continuam sendo válidos.

A regra só vale para novos certificados, emitidos a partir de 15 de abril de 2022.

A CIL e a CIP ainda emitirão certificados?

A CIP anunciou a suspensão imediata do recebimento de solicitações de certificado. Ou seja, a instituição não irá aceitar novos pedidos, porém isso não afeta os processos que já estão em avaliação pela instituição.

A CIL informou , por meio do site, que não pode garantir que seja possível processar os pedidos com entrada a partir de 20 de março de 2022. Porém, a instituição está aceitando novos requerimentos e pagamentos.

Segundo o advogado Renato Martins, sócio da Martins Castro, a situação na CIL já foi normalizada. De acordo com o advogado, a instituição orientou temporariamente os requerentes a não fazerem o pagamento, mas já está operando normalmente com relação a novos requerimentos e a pagamentos. A CIL contatou “por e-mail os processos submetidos autorizando o pagamento da taxa”.

Muda alguma coisa para quem está com o processo de tramitação?

Para quem já deu entrada na conservatória ou vai dar entrada até 30 de agosto de 2022, não muda nada. As requisições de nacionalidade enviadas a partir de 1º setembro de 2022 devem seguir as novas regras.

Caso Abramovich e outras polêmicas envolvendo a lei

O caso Abramovich pôs holofotes na lei de concessão de nacionalidade portuguesa por via sefardita, mas essa normativa causa polêmicas desde que foi criada, em 2015.

Aqueles que discordam desse mecanismo de reparação história consideram suspeitos os lucros obtidos pelas Comunidades Israelitas. Esses recursos são auferidos por meio das doações exigidas pelas comunidades para efetuar a análise do vínculo sefardita. Segundo os críticos, há o risco que o procedimento se torne uma “fábrica de passaportes portugueses”, com pouca precisão técnica e muito orientada ao lucro.

Até o final de 2021, a CIP e CIL, juntas, emitiram mais de 86.000 certificados e, do total de requerimentos, 75.500 (quase 90%) foram direcionados à Comunidade Israelita do Porto. Uma reportagem do jornal Observador mostrou que instituição cresceu exponencialmente depois da lei promulgada em 2015: passou de 20 membros em 2012 passou para 400 em 2021, inaugurou um hotel, um banho ritual e um museu, o Museu do Holocausto.

Um segundo ponto levantado pela oposição à lei é a concessão de cidadania a um grande número de pessoas, muitos sem ligação efetiva à Portugal. Ao contrário da lei espanhola de mesmo propósito, que já foi promulgada em 2015 com “prazo de validade” (de três anos prorrogável por mais um), a lei portuguesa não estabelece um limite temporal.

Isso abre uma possibilidade, segundo os críticos, para um possível aumento descontrolado da imigração em Portugal, já que a lei possibilita que milhões de pessoas consigam a nacionalidade portuguesa.

O número de requerimentos e concessões têm aumentado ano a ano, desde a promulgação da lei. Até o final de 2021, 32.192 requerentes já haviam conseguido a cidadania junto à conservatória e só em 2020, 20.892 requerentes tiveram a cidadania concedida, o que representa quase 70% do total histórico.

Segundo o relatório anual do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), em 2020 foram feitos 68.981 requerimentos de nacionalidade portuguesa, dos quais 24.394 foram feitos com base na lei de ascendência sefardita, o que representa mais de um terço dos pedidos.

Considerações Finais

Mudar de país exige, além de conhecimento da lei, um planejamento financeiro e emocional. Para ajudar com as dúvidas que surgem nesse processo, o Euro Dicas criou um Programa específico para quem está pensando em viver, estudar ou trabalhar em Portugal.

O Programa Morar em Portugal, elaborado por brasileiros, fornece as informações necessárias fazer essa transição da melhor maneira e fugir dos perrengues que muitos enfrentam ao se mudar para a terra de Camões.