Alugar um imóvel tem sido um grande desafio em Portugal, até mesmo para os portugueses. Mas se a barreira para a população local é, principalmente, o valor cada vez mais alto dos aluguéis, para os brasileiros a tarefa ganha contornos mais dramáticos.

É o que aponta entrevista feita pelo jornal Diário de Notícias com a presidente da Casa do Brasil, Cyntia de Paula. A Casa é uma associação de imigrantes, sem fins lucrativos, fundada por brasileiros residentes em Portugal e portugueses amigos do Brasil, sendo aberta a todas as nacionalidades.

De acordo com Cyntia, ainda há “muito preconceitos e estereótipos” da parte dos proprietários de imóveis em relação à comunidade brasileira. Ela reconhece que o problema se estende a outras nacionalidades e também é frequente em outros países, embora tenha se mostrado mais crítico para os brasileiros.

Chegam a pedir um ano de aluguel antecipado

Não é raro ouvir histórias de brasileiros em Portugal que já chegaram a pagar um ano de aluguel antecipado para conseguir fechar o contrato.

“Há pessoas que fazem empréstimos no banco para conseguir assumir esse compromisso”, afirmou a presidente na entrevista.

Além do pagamento antecipado, muitos proprietários exigem um número maior de cauções, o que acaba tornando o desembolso inicial ainda mais elevado. Grupos de WhatsApp de brasileiros a que o Euro Dicas teve acesso trazem discussões que confirmam a prática. É comum ouvir relatos de quem tem que deixar o valor de mais de três aluguéis como garantia para alugar apartamento em Portugal.

Alguns proprietários não aceitam inquilinos brasileiros

Segundo a representante da Casa do Brasil, há aqueles que respondem que a moradia já está alugada quando ouvem a voz de brasileiros ao telefone. E é ainda pior com mulheres, pois “ainda existe muito essa ideia de que vão utilizar a casa para fins de trabalho sexual”, afirmou na recente entrevista.

A reportagem do Euro Dicas ouviu corretores que, sob a condição de não se identificarem, confirmam que muitos de seus clientes já determinam que não querem alugar para imigrantes, especialmente para brasileiros.

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“Mostramos que os clientes, se atenderem a todas as condições do futuro contrato — sejam elas gerais ou específicas do ponto de vista legal — não poderiam ser excluídos. Mas muitas vezes o senhorio já inclui essa condição ao nos trazer o seu imóvel para o alugar”.

As boas pessoas pagam pelos erros dos outros

Apesar da percepção de muitos proprietários se basear nitidamente em preconceito (em uma ideia pré-concebida do perfil do inquilino brasileiro), os corretores também relatam que, infelizmente, “os bons pagam pelos maus exemplos”.

Os corretores ouvidos (tanto brasileiros – há muitos trabalhando em Portugal nesta área-  quanto portugueses) sempre têm um caso negativo para compartilhar.

“Não é apenas com brasileiro, mas com imigrantes de modo geral. Os proprietários ficam com pé atrás porque não se sentem seguros ao imaginar que o inquilino pode sumir ou voltar para o seu país de origem, deixando dívidas ou estragos na moradia”, relata um dos ouvidos pela reportagem.

Em outro relato, um proprietário que não vinha recebendo o aluguel em dia decidiu ir pessoalmente ao seu apartamento para falar com o inquilino. Ao chegar, o vizinho alertou: “chegou tarde, ele já voltou para o Brasil”.

Um relatora ressalta que “claro que pode haver exagero por parte de alguns proprietários“. Mas é verdade que muitos acabam pedindo um grande valor antecipado ou “muitos meses de caução para evitar dor de cabeça no futuro”.

“Mesmo quando não há nenhum tipo de preconceito, nem sempre conseguimos que o ‘pretendente’ ao aluguel reúna a documentação necessária, o que é doloroso quando sabemos que é um conterrâneo, mas trata-se de uma relação contratual, com requisitos claros a serem cumpridos.

A mesma corretora reforça que essa não é uma questão específica de Portugal:

“Se a pessoa fosse tentar alugar um apartamento no Brasil e não apresentasse as garantias necessárias, teria a mesma dificuldade”, finaliza.

Dificuldades vão além da xenofobia

Para os imigrantes, porém, o processo de alugar uma casa ou apartamento não tem sido tão simples, mesmo que não haja qualquer xenofobia em jogo. Isso se deve, principalmente, pelas exigências feitas pelos proprietários, que querem um fiador em Portugal e comprovantes de renda ou contrato de trabalho.

Para quem acaba de chegar no país, dificilmente terá um fiador português, um contrato de trabalho em Portugal e uma declaração de imposto de renda (IRS), requisitos que dificultam o aluguel.

Roupas secando no varal
As dificuldades vão além da xenofobia e há quem aceite viver em situação precária.

Na entrevista publicada no Diário de Notícias, a presidente da Casa do Brasil mostra que essa dificuldade para cumprir as exigências (ainda que todas legais) faz com que muitos aceitem assumir aluguéis sem contrato e em condições que não são dignas. Segundo ela, muitos dos recém-chegados, “vão para quartos, porque as exigências acabam por ser menores”.

Há pessoas vivendo em situações precárias

A imprensa portuguesa tem noticiado uma prática que já surgiu em alguns pontos, ainda que de forma mais tímida: as pessoas que acabam tendo que viver acampadas em barracas. Em outro artigo do jornal Diário de Notícias, o exemplo de duas brasileiras acabou ganhando visibilidade.

Mas a alternativa que tem mais surgido é o compartilhamento de casas e apartamentos. Segundo Cyntia de Paula:

“a solução que as pessoas muitas vezes encontram para um problema de acesso à habitação é habitarem de forma coletiva, o que deveria ser encarado como um problema a ser resolvido ao nível das políticas públicas”.

E ainda há os casos em que o proprietário aluga um quarto em Portugal para várias pessoas, que acabam pagando para ter apenas uma cama, sendo obrigadas a conviver no pequeno espaço com outras pessoas.

“Nós não temos muitos relatos de pessoas vivendo nessa situação”, afirmou a presidente da Casa do Brasil, “mas a prática é comum para algumas outras comunidades”.

Vale lembrar também que há alguns imigrantes que acabam tendo que enfrentar o sistema de “cama quente”, prática na qual a pessoa tem direito à cama por algumas horas do dia, como se fosse um “rodízio” para dormir.

Preços altos dificultam a vida de imigrantes e portugueses

Deixando de lado os eventuais casos de preconceito e a dificuldade com a documentação, um ponto tem sido o tormento de quem busca uma casa ou apartamento para alugar: os preços cada vez mais altos das rendas (o equivalente ao que se chama de aluguel no Brasil).

Dados recentes do Eurostat mostram que o crescimento no valor dos aluguéis se deu de forma quase generalizada na Europa. No segundo trimestre deste ano, a variação média foi de 0,7% em relação ao trimestre anterior e de 3% em relação ao mesmo período do ano passado na região.

Portugal não foi o país que apresentou a maior variação (a Estônia lidera esse ranking, com mais de 200% de aumento desde 2010) ao longo dos últimos anos, mas está entre aqueles países com alta variação nos preços.

De 2010 para cá, o valor dos aluguéis em Portugal cresceu mais do que a média da zona do Euro, segundo o Eurostat.

Aumento do aluguel é maior que a inflação e o PIB

Dados do Censo 2021 português confirmam a alta variação no valor dos aluguéis, que ficaram acima da inflação média nos últimos 10 anos. Segundo as informações disponibilizadas, os aluguéis aumentaram cerca de 3,6% ao ano, uma variação 4,5 vezes maior que o da inflação e o dobro do crescimento do PIB no mesmo espaço de tempo.

Desde então os preços não pararam de subir, a um ritmo ainda mais intenso. Os dados mais recentes do INE (Instituto Nacional de Estatísticas) apontam que o aluguel médio dos mais de 20 mil novos contratos (segundo trimestre 2023) em Portugal ficou em torno de 7,27€ por m², um crescimento de 11% em relação ao período homólogo.

Valores médios subiram em todo o país

Os maiores valores médios ficaram na área metropolitana de Lisboa (11€ por m²), Algarve (8,3€s por m²) e área metropolitana do Porto (7,8€ por m²). Se forem consideradas apenas as cidades com mais de 100 mil habitantes, Lisboa (15,2€por m²) e Oeiras (13,2€ por m²) foram os valores mais altos.

Na prática, pesquisa feita em alguns dos principais portais imobiliários de Portugal mostram apartamentos T2 (dois quartos) em Lisboa por preços que chegam a passar os 1.500€ por mês, valor pouco acima do praticado no Porto (cerca de 1.200€ a 1.300€). Para um T3 (três quartos), o aluguel pode ultrapassar os 2.000€ por mês.

Quando se compara com o valor médio do salário em Portugal (1.539€ euros brutos, segundo os dados mais recentes do INE), fica clara a dificuldade para alugar um imóvel, seja imigrante ou cidadão local.