Em minhas memórias de infância, o carro está muito presente. Desde as viagens de carro em família até os dias em que ajudava meu pai a lavar o carro e acabava tomando banho de mangueira. Depois, eu mesma tive carro por uns 10 anos.

Nas cidades brasileiras onde vivi (Brasília e Floripa), me parecia quase indispensável ter um carro. Mas foi só chegar na Europa para mudar de ideia. Hoje em dia, se você me perguntasse se é necessário ter carro na Espanha, eu diria que não. Mas na verdade, isso depende. Quer saber por quê?

Acompanhe que eu explico por que ter carro na Espanha é (quase sempre) um desperdício.

Dificuldades de quem tem carro na Espanha

Eu estava viajando de férias pelo Norte da Espanha quando vi um carro de modelo antigo e me dei conta:

“Esse tipo de carro não se vê em Barcelona”.

O motivo para isso não tem nada a ver com a condição financeira da população barcelonesa. Mas sim com a Zona de Baixas Emissões (ZBE).

Com mais de 95 km2, a ZBE de Barcelona é a maior do país, incluindo toda a capital catalã e partes de outras cidades ao redor. Nessa zona é proibida a circulação de veículos mais contaminantes durante os dias úteis de 07h às 20h. Isso significa que automóveis e motos com matrícula anterior a 2006, em geral, têm circulação bastante restrita na cidade.

Existem ZBE na Espanha e em outros países

E essa é uma das dificuldades de ter carro na Espanha, já que isso também se aplica a Madri, ainda que em uma zona menos extensa. E em outras cidades espanholas, como aqui em Valência, a ZBE pode ser ativada em períodos específicos de alta contaminação.

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Aliás, em outras cidades da Europa, como Londres, Paris, Berlim e Bruxelas, também existem restrições similares.

Encontrar estacionamento na Espanha é outra dificuldade

– Nos encontramos na saída do metrô? – me perguntou um amigo catalão que vivia em uma cidade próxima a Barcelona.
– Sim, pode ser. Mas você não vem de carro?
– Vou sim. Mas vou estacionar onde encontrar uma vaga e sigo com o metrô.

Encontrar uma vaga para estacionar é outra das dificuldades de ter carro na Espanha, principalmente nas grandes cidades. Aqui em Valência, por exemplo, estacionar em fila dupla é uma prática comum. Encontrar flanelinhas que “estavam guardando essa vaga especialmente para você” também.

Em Barcelona, por sua vez, há maior controle para que não ocorram esses tipos de situações. Mas isso não diminui a dificuldade de encontrar uma vaga, ainda mais se for grátis. Na cidade, existem basicamente cinco tipos de estacionamentos:

  • As zonas verdes são reservadas para residentes, que pagam cerca de 1€ por semana para estacionar próximo da sua casa;
  • As zonas azuis são de uso livre, com cobrança por tempo, como em algumas cidades brasileiras;
  • As zonas amarelas são de carga e descarga de mercadorias e exigem registro por aplicativo próprio;
  • As zonas brancas são as únicas livres e gratuitas, mas ficam longe do centro;
  • E há estacionamentos pagos (geralmente subterrâneos).

Transporte público na Espanha

– Amiga, quanto custa comprar um carro na Espanha? – me perguntou um outro amigo que estava visitando Barcelona e pensando em se mudar para a cidade.
– Comprar um carro? Para que você quer comprar um carro com um transporte público desses? – foi minha resposta para ele.

Fui muito tendenciosa em minha resposta? Talvez sim. Mas eu realmente acredito que, em Barcelona especialmente, não faz falta ter um carro. Porque é possível deslocar-se por toda a cidade com transporte público, de forma cômoda e relativamente rápida e barata.

Funicular em Barcelona
Um dos funiculares de Barcelona subindo até Vallvidrera Superior

Aliás, na minha opinião, Barcelona tem uma das melhores redes de transporte público de toda a Espanha. Para locomover-se pela cidade e arredores há metrô, ônibus, trem, “tram” (bonde) e até funicular.

A disponibilidade e a frequência são grandes (inclusive durante a noite e a madrugada). Os veículos são modernos e confortáveis. Os preços são acessíveis. E a rede é bem comunicada com quase toda a Catalunha. E, sempre que desejar, é possível alugar um carro na capital da catalunha.

Em alguns casos, ter carro na Espanha é necessário

Quando eu digo que talvez tenha sido tendenciosa em minha resposta é porque reconheço que há casos e casos.

Digamos, por exemplo, que você encontre trabalho em Barcelona, mas decida ir morar em uma cidade que fica à 1h30 em trem da capital catalã. Ou quem sabe você opte por viver e trabalhar em Barcelona mesmo, mas seu trabalho exija um veículo próprio.

Pessoas que vivem em situações como essas provavelmente vão discordar da minha afirmação de que é um desperdício ter carro na Espanha. E pode ser também que não se trate de Barcelona, mas de outra cidade da Espanha. Vejamos:

Transporte público em Madri e Valência

Madri e Barcelona são parecidas no sentido de ampla disponibilidade de meios, alta frequência de linhas e boa comunicação com regiões próximas. Ainda assim, o metrô de Madri me pareceu bem mais estreito e apertado do que o de Barcelona, ou seja, menos confortável.

Aqui em Valência, a disponibilidade de metrô é menor do que em Madri e Barcelona. Por outro lado, a rede de ônibus dá conta de todos os trajetos necessários. Agora, quando se trata de ir para cidades vizinhas, dependendo da direção ou distância, nem sempre é tão fácil.

Tickets de transporte público
Tickets de transportes públicos integrados de Madri, Barcelona e Valência

De todo modo, comparando com as cidades brasileiras onde morei, eu diria que a qualidade do transporte público espanhol, em geral, é melhor. Além disso, em cada cidade, os tickets de todos os tipos de transporte geralmente são integrados (o que facilita bastante a vida). E comparado a outros países da Europa Ocidental, as tarifas cobradas por aqui são bem mais baratas.

Esse é um dos principais motivos pelos quais eu considero que não é preciso ter carro na Espanha.

Bicicletas e patinetes

Vou confessar uma coisa da qual eu morro de vergonha: eu não sei mais andar de bicicleta. Até os meus 15 anos eu tive uma Caloi de 16 marchas e pedalava até sem as mãos no guidom.

E já sei que dizem que é uma coisa que a gente nunca esquece. Mas eu esqueci ou tive algum trauma que já não me lembro. Se não fosse por isso, eu poderia “ir em bici” (como se diz por aqui) para quase todo lado.

Contador de bicicletas
“Em Valência sua bicicleta conta” – um dos contadores de bicicletas espalhados pela cidade

Aliás, de acordo com uma pesquisa da Organização de Consumidores e Usuários (OCU), Valência é a melhor cidade da Espanha para circular com bicicleta. São mais de 164 km de vias exclusivas para andar em duas rodas com segurança. Todas bem conectadas. Há vários estacionamentos disponíveis. E para completar a cidade é toda plana, facilitando a vida dos ciclistas.

Se tem muitos ciclistas por aqui? Sim. Eu diria que uns 30% dos moradores de Valência andam de bicicleta regularmente. De acordo com a Prefeitura, são uns 8.500 ciclistas por dia. Não é assim como em Amsterdam, onde parece que as pessoas já nascem sabendo pedalar e o tráfego de bicicleta chega a ser mais intenso que o de carros. Mas há bastante ciclistas, sim.

Ciclismo em outras cidades da Espanha

Sevilha e Barcelona são as seguintes colocadas no ranking das melhores cidades espanholas para se deslocar em bicicleta. Em seguida vêm: Palma de Maiorca, Zaragoza, Málaga, Las Palmas de Gran Canaria, Bilbao e Múrcia. Enquanto Madri ocupa a 10ª posição (provavelmente, pelo tamanho da cidade).

Em todo caso, em todas essas cidades há serviços de aluguel de bicicletas e de patinetes na rua (e também de motonetas, em algumas). E em geral é possível combinar a bicicleta ou o patinete com o transporte público. Sem contar os benefícios para a saúde e para o meio ambiente.

Portanto, se (diferente de mim) você sabe andar de bicicleta, essa é uma ótima alternativa para se locomover sem ter carro na Espanha.

Ter carro na Espanha sem ter que comprar um

Desde que eu vim morar na Espanha (quem leu minhas outras colunas sabe que já faz quase quatro anos), eu aluguei carro umas quatro vezes. Todas elas foram para viajar e, em geral, para lugares inacessíveis com outros tipos de transporte.

Eu já fiz várias viagens usando transportes coletivos também. No ano passado, por exemplo, percorri Sevilha, Córdoba e Granada usando apenas trens, ônibus e muita sola de sapato.

Mas algumas vezes eu quero explorar vários lugares em poucos dias e os horários dos transportes coletivos acabam não ajudando muito nos planos. Ou então eu decido ir acampar em algum lugar no meio do nada em que os transportes tradicionais não chegam. Em casos assim, pontuais, eu acho que alugar um carro é uma boa opção. Mas também existem outras.

Aluguel por longo prazo: renting e leasing

Se para você é necessário ter carro na Espanha e você não quer arcar com os custos de comprar um, duas boas alternativas são o renting e o leasing.

O renting é um aluguel de carro por longo prazo – normalmente, entre três e quatro anos – sem a opção de compra no final do período. Os gastos de manutenção ficam a cargo da empresa.

O leasing é parecido ao renting, com a diferença de que o tempo mínimo de aluguel costuma ser de dois anos. E há a opção de comprar o veículo no final do período. As parcelas são normalmente menores que as do renting, mas os custos de manutenção ficam por conta do usuário.

Aluguel por médio prazo: carro por assinatura

Uma opção mais recente para ter carro na Espanha sem ter que comprar um veículo próprio. Trata-se de uma assinatura que pode ter duração de 1 a 36 meses, com a opção de trocar de carro segundo as suas necessidades.

É possível, por exemplo, contar com um utilitário para ir ao trabalho durante a semana e trocar por um SUV para viajar nos fins de semana.

Aluguel por curto prazo: carsharing

Esta opção é semelhante ao aluguel de bicicletas e motonetas na rua, para ser utilizada em trajetos curtos e em momentos pontuais. Você se inscreve em uma empresa de carsharing, usa um app para encontrar um carro próximo e abre o veículo usando um cartão eletrônico.

O preço, geralmente, é por minutos de uso do veículo e a cobrança é feita mensalmente pela sua conta na empresa de carsharing.

A CNH brasileira e o “canje”

Agora que você já sabe que é possível ter carro na Espanha sem ter que comprar um, você deve estar se perguntando: E a CNH brasileira é válida na Espanha?

Sim, é possível dirigir na Espanha com a carteira de motorista brasileira, mas por um prazo limitado: 180 dias. Ou seja, por 6 meses, desde o dia da sua entrada no país, você pode dirigir usando a CNH brasileira e nem precisa da Permissão Internacional para Dirigir (PID).

trem de alta velocidade na Espanha
Trem de alta velocidade que usei para ir de Sevilha a Córdoba

Mas depois disso, é necessário fazer o “canje de permiso“, quer dizer, trocar sua carteira de motorista brasileira por uma espanhola.

No artigo Carteira de motorista na Espanha: veja como trocar ou tirar a sua, a Camila da Cunha explica tudo sobre o tema.

Distâncias na Espanha

Como eu disse no início deste texto, no Brasil, me parecia indispensável ter um carro. Primeiro, devido às condições do transporte público brasileiro.

Em Floripa, quando fiquei sem carro, eu já cheguei a ficar mais de 1h esperando por um ônibus. E algumas vezes tive que caminhar mais de 4km até o ponto onde conseguia pegar uma carona. Aliás, as distâncias que tinha que percorrer eram outro dos pontos que justificavam essa opinião.

Aqui na Espanha, por outro lado, as distâncias costumam ser bem menores. E esse é outro fator que me leva a acreditar que, em geral, ter carro na Espanha é um desperdício.

Cidades menores

Aqui em Valência, por exemplo, em 30 minutos de caminhada é possível atravessar praticamente a cidade inteira, de Leste a Oeste. Em Barcelona, dependendo da direção, essa caminhada levaria um pouco mais ou um pouco menos de tempo. Mas com a eficiência do transporte público local, nem é preciso gastar tanta sola de sapato.

A questão é que as cidades espanholas costumam ser realmente bem menores. Só para ter uma noção: enquanto Brasília tem 5.832 km2, São Paulo tem 1.522 km2 e Floripa ocupa quase 675 km2, Madri tem pouco mais de 604 km2, Barcelona chega apenas a 101 km2 e Valência tem pouco mais de 134 km2.

Uma questão de escolha

Independentemente do país, a compra de um carro não pode ser considerada como um investimento, já que o veículo se desvaloriza ao longo do tempo. Ou seja, em qualquer lugar, comprar um carro é sinônimo de gasto.

Ainda que, às vezes, o veículo seja realmente necessário. Além disso, ter um carro também pode ser sinal de conforto e de independência, já que você pode ir onde quiser e quando quiser.

Ainda assim, da mesma forma que no Brasil, os preços do combustível por aqui também andam proibitivos. E um carro particular não deixa de ser uma forma pouco sustentável de locomoção. Quer dizer, como tudo na vida, ter um carro tem os seus prós e contras.

A minha opinião

Mas eu volto a dizer que, na minha opinião, em geral, não é necessário ter carro na Espanha. Pela eficiência do transporte público, pelas distâncias muito menores a percorrer e pelas formas alternativas de transporte – como a bicicleta e o patinete – que aqui são bem mais viáveis.

Só que, é claro que tudo depende das suas condições e da sua situação. Vai que você compra um carro elétrico e um apartamento com garagem. Ou quem sabe, assim como eu, você não saiba andar de bicicleta. Eu opto por caminhar e usar o transporte público. E você?