Será que o imigrante brasileiro é bem recebido na França, país em que mais de 10% da população total é estrangeira? Neste artigo, tecemos alguns comentários sobre o assunto, trazendo algumas vivências e dados de pesquisas. Boa leitura!

O imigrante brasileiro costuma ser bem recebido na França.
Índice Afinal, o imigrante brasileiro é bem recebido na França? Existe xenofobia? Gênero e receptividade de imigrantes brasileiros na França Nível de formação dos imigrantes na França Dá para o imigrante brasileiro se sentir em casa na França?

Afinal, o imigrante brasileiro é bem recebido na França?

De maneira geral, sim, o imigrante brasileiro é bem recebido na França.

É quase impossível dizer que você vem do Brasil e não ver um sorriso acompanhado de palavras como futebol, samba e carnaval — por mais que nós, brasileiras e brasileiros, saibamos que o Brasil é muito além disso, seja para o bem ou para o mal.

Acredito que nosso país tenha uma imagem muito positiva na França e tenho a sensação de que causamos uma boa impressão nos franceses por conta de nossa simpatia e jeito de ser. Muitos franceses, inclusive, acolhem com carinho o sotaque do brasileiro falando francês.

Para você ter uma ideia de quantos somos no Hexágono, uma pesquisa do INSEE publicada em 2022 revela que 2% dos imigrantes na França são brasileiros. É um número maior do que os imigrantes provenientes de países como Índia, Congo, Suíça e Estados Unidos, por exemplo.

Nem sempre as experiências são positivas

Se eu fosse considerar somente minha experiência, eu poderia dizer que o imigrante brasileiro é bem recebido na França sempre. Isso porque em nenhum momento tive problemas com a questão da receptividade, mesmo quando ainda não falava francês.

Isso foi um dos fatores que contribuiu para que eu pensasse em vários momentos que eu não queria mais voltar para o Brasil.

No entanto, é preciso fazer alguns adendos: sou uma mulher branca que circula, principalmente, em espaços universitários, e cuja estadia no país contou com uma assistência completa por conta de uma bolsa de estudos na França. Portanto, trata-se de uma experiência muito singular e privilegiada.

Há as diferenças culturais

Por outro lado, já ouvi brasileiras e brasileiros relatarem experiências negativas ou desafiadoras de receptividade na França. Não exatamente por conta de sua nacionalidade, mas sim por terem dificuldades com o idioma ou com os costumes diferentes dos franceses.

Exemplos desse último ponto é a diferença na maneira pela qual tratamos desconhecidos. Nós, brasileiros, somos sempre muito informais, enquanto os franceses são o exato oposto. Ainda, os brasileiros têm o hábito de tocar e ser afetuoso com pessoas mais próximas, ao passo que os franceses possuem uma postura mais distante.

Sendo assim, não é raro que um brasileiro leia como falta de receptividade uma forma de agir que é a normal praticada pelos franceses.

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A recepção do imigrante brasileiro na França varia de região para região

O imigrante brasileiro poder ser bem recebido em certos lugares da França, mas em outros nem tanto. Nesse sentido, o tipo de acolhimento para com os estrangeiros muda até mesmo de bairro para bairro. Já passei por experiências um pouco estranhas em certos lugares, enquanto era muito bem tratada em outros.

Acredito que isso depende muito da particularidade dos espaços e das pessoas que circulam nele. Nos bairros onde se localizam as Universidades de Paris, por exemplo, o fato de ser brasileira não era nada que os franceses estranhavam, muito pelo contrário, causava até uma certa curiosidade.

Porém, em outros arrondissements, eu sentia que os franceses tinham receio de minha origem latina. O mesmo ocorre com as regiões do país. Há lugares nos quais as pessoas acabam sendo mais receptivas e abertas, em outras não.

Pesquisa confirma a diferença entre regiões

A título de exemplo, uma análise estatística do SSMSI em relação às infrações de caráter racista, xenófobo ou antirreligioso em 2022 apresentou que o número de crimes desse tipo é mais alto as regiões da Île-de-France, do Bas-Rhin, dos Alpes Marítimos e do Rhône.

Por outro lado, as taxas são menores em regiões como Morbihan, Vendée, Gers, Ardèche, Réunion.

No entanto, ressalto que a diferença de tratamento ocorre muito mais pelo fato de estarmos na condição de imigrante, do que pelo fato de sermos brasileiros. Pelo que pude averiguar, no nosso caso, afirmar nossa nacionalidade conta mais como um ponto positivo.

Existe xenofobia?

Sim, mas a xenofobia é um problema generalizado no país. Prova disso foi a recente aprovação da lei de imigração na França.

Similarmente, vale sublinhar que certas nacionalidades acabam sofrendo mais com a xenofobia do que a brasileira. Para você ter uma ideia, a mesma análise estatística do SSMSI mencionada acima contabilizou 12.600 infrações de caráter racista, xenófobo ou antirreligioso em 2022, apresentando um leve aumento em relação ao ano anterior.

Entretanto, é importante dizer que nem sempre a xenofobia aparece de maneira explícita. Apesar de ser mais comum que ela apareça escancaradamente, eu pelo menos já vivi várias experiências nas quais ela surgiu sutilmente. É um incômodo com uma frase ou uma reação, que você só entende como xenofobia após pensar um pouco sobre isso.

Imigrantes em rua gastronômica em Paris.
Uma volta pelas cidades francesas é o suficiente para se deparar com uma diversidade de nacionalidades. Foto: Bárbara Ábile.

Por exemplo, já ouvi algumas vezes que eu não tinha “cara” ou “jeito” de brasileira. Similarmente, em uma ocasião, um francês questionou rispidamente uma amiga a respeito de sua origem, pois, segundo ele, ela tinha “traços de pessoas da Síria”, além de um sotaque diferente.

Quando ela afirmou que ela era brasileira, a pessoa se espantou e falou que não parecia, alterando seu tom para um mais amigável.

Problemas específicos com brasileiros

Em minha experiência, não identifiquei problemas específicos dos franceses com imigrantes brasileiros, mas sim, conflitos mais pontuais. Por exemplo, em ambientes de trabalho, já ouvi que, para alguns franceses, a produtividade de brasileiros fica aquém do esperado, profissionalmente falando.

De maneira geral, pode-se dizer que as duas maiores questões que apresentam problemas para os franceses em relação à presença de estrangeiros em seu país são, por um lado, o acesso facilitado a benefícios sociais (como o sistema de saúde na França e a CAF) e, por outro, o medo do terrorismo. Além disso, soma-se ainda o racismo e o preconceito religioso.

Tais pontos foram lapidares para que 60% dos franceses afirmassem que a França acolhe imigrantes demais, em uma pesquisa de 2018.

Nesse sentido, há nacionalidades estrangeiras em maior número na França (atualmente, principalmente da África e da Ásia), mas a brasileira não está entre elas. Não se pode dizer o mesmo das populações vindas da Síria e do Iraque, por exemplo, que segundo a mencionada pesquisa de 2018, suscitam “medo ou preocupação” em 54% dos franceses.

Gênero e receptividade de imigrantes brasileiros na França

A receptividade do imigrante na França depende de inúmeras variáveis: nacionalidade, religião, cor da pele, mas também o gênero.

No que se refere às imigrantes brasileiras, é inegável que sua receptividade na França sofre influência de estereótipos machistas, que na maioria das vezes dizem respeito ao corpo, beleza e sexualidade.

Vale dizer que, por muitos anos, esses estereótipos foram inclusive a imagem oficial que o Brasil projetava para além das suas fronteiras geográficas.

Sendo assim, não foram poucas às vezes em que ouvi franceses falando sobre como as mulheres brasileiras são belas e possuem atributos físicos valorizados pelo padrão de beleza vigente — mesmo em um contexto em que tais informações eram completamente irrelevantes.

Esse tipo de abordagem com a imigrante mulher acaba atingindo-a de diferentes formas e com diferentes níveis de gravidade, a depender do contexto social no qual ela está inserida.

Nível de formação dos imigrantes na França

Segundo dados do Museu da História da Imigração, os imigrantes assumem, em sua maioria, empregos não qualificados. Por exemplo, se 19,4% da população francesa possui empregos manuais, 28,5% dos imigrantes ocupam cargos desse tipo.

Outro dado também é bastante revelador: em 2020, 37,8% dos imigrantes não tinham nenhum diploma.

Aqui, vale apontar que tais números variam bastante em função das origens. Nesse sentido, os brasileiros tendem a se encaixar em uma porcentagem um pouco maior. Veja a tabela abaixo sobre o nível de diploma de imigrantes e seus descendentes na França, construída a partir dos dados de uma pesquisa de 2023 do INSEE:

Nível de formação Total de imigrantes Imigrantes da América e Oceania
Sem diploma 38% 33%
Ensino médio 14% 15%
Superior 32% 43%

Aqui vale ressaltar que muitos brasileiros acabam indo morar na França em um contexto de colaboração entre universidades francesas e brasileiras, ou até mesmo entre empresas. Isso faz com que parte dos imigrantes brasileiros no país acabam sendo tão qualificados quanto o resto da população francesa, portanto, mais bem recebidos na França.

Qualificação impacta como imigrantes brasileiros são recebidos na França

A qualificação profissional e educacional do imigrante brasileiro acaba tendo impacto em sua recepção na França, assim como em qualquer lugar do mundo. Isso porque um imigrante que não possui pelo menos um desses dois tipos de qualificação, provavelmente chegará ao país em uma situação mais vulnerável.

Isso pode impactar em sua inserção social, por exemplo, sem contar nas eventuais dificuldades burocráticas que ele pode enfrentar. Quem já tentou alugar um apartamento na França, sabe do que estou falando!

Digo por experiência própria que, ser imigrante na França já é desafiador o suficiente, mesmo para aqueles que vão para o país completamente assistidos em relação a recursos financeiros, moradia, acesso a plano de saúde e trabalho. Para alguém que não possui nem isso, acaba sendo realmente muito mais complicado.

Imigrante brasileiro na França trabalhando como garçom.
Os trabalhos na área de serviços costumam ser amplamente ocupados por imigrantes.

No entanto, as comunidades de brasileiros em redes sociais, como o Facebook, costumam afirmar que não é tão difícil encontrar empregos e começar a trabalhar na França. Vagas temporárias para garçons e garçonetes, vendedores e vendedoras, guias, cuidadores em geral, e trabalhos manuais costumam aparecer bastante nesses fóruns.

Dá para o imigrante brasileiro se sentir em casa na França?

Sim, mas isso dependerá de sua abertura para fazer da França uma nova casa para você.

Afirmo isso porque as diferenças culturais entre Brasil e França são enormes e alcançam variadas dimensões. O jeito de ver a vida, a relação com o trabalho, a proximidade com pessoas, as prioridades, o acesso a certos tipos de coisas, e o hábito a certos padrões são apenas alguns exemplos.

Portanto, para que o Hexágono se torne uma casa para você, será preciso encontrar, em meio tantas diferenças, algo de familiar. Mas isso, é claro, dependerá muito de suas vivências no país.

Eu, por exemplo, vejo a França como meu lar e quando passo alguns meses longe do país, digo que estou com vontade de voltar para casa. Para mim foi muito claro como minha mudança para lá alterou tudo o que eu dava por certo, até então. É como se lá tivesse nascido uma nova Bárbara, e é ela quem vive até hoje.

A Nathane Costa, redatora do Euro Dicas, mora na França (em Bourdeax) desde 2021. Ela contou pra gente como se sente morando no país e deu sua opinião:

 

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A condição de imigrante permanece

No entanto, já conheci muitos brasileiros que, apesar de gostarem de morar na França, não conseguiam se sentir à vontade no país e não viam a hora de voltar para o Brasil. Talvez essa sensação venha pelo fato de que, apesar das afinidades, a condição de imigrante acaba sendo um pouco incômoda. Inevitavelmente, você se sente um pouco incompleto por lá (alô, invisibilidade do imigrante).

O que quero dizer é que você pode amar a sua vida francesa e todas as possibilidades que o país oferece, mas sempre terá algo faltando. Seja sua família, seus animais de estimação, o grupo de amigos da infância, a cerveja no copo americano, o calor, as referências, entre outros.

Sou da opinião de que por mais que você consiga fazer da França a sua casa, você nunca será um francês e europeu. Veja bem, isso não tem a ver com ter ou não uma cidadania europeia, mas sim com algo mais simbólico. Mesmo a França sendo a sua casa, lá você sempre será um brasileiro e latino-americano.

Se tem vontade se se tornar um imigrante, recomendo a leitura do ebook “O Sonho de Viver na Europa” para conhecer a experiência de outros brasileiros que vivem no continente e compartilhas as suas oportunidades e dificuldades.