Eu me lembro bem do meu primeiro encontro com a capital francesa, em 2018. Fazia muito calor, era verão, e eu trazia comigo um amontoado de clichés sobre a cidade: pensava que os parisienses eram todos parecidos, mas existe a Paris da ficção versus a Paris real. Eu tinha dificuldade em imaginar uma cidade diversa, pois toda a imagem que eu tinha de Paris era a de uma cidade padronizada, sem misturas, imagem essa trazida em grande parte pelos filmes que retratam a capital.
Neste artigo eu falo sobre a Paris da ficção versus a Paris real, ou seja, comparo os estereótipos que muitos de nós carregamos com a visão real que eu tenho da cidade, depois de quase 3 anos vivendo aqui.
Vale dizer que essa é uma narrativa pessoal da cidade, influenciada por vários acontecimentos que me atravessaram e mudaram a minha perspectiva. Quer saber? Então continua comigo!
Nem sempre você terá o luxo do espaço
Quando vim morar em Paris, em 2019, comecei a entender sem demora que teria que viver com menos metros quadrados à minha disposição. Passei 7 meses em um estúdio de 18 metros, tentando aproveitar cada mísero espaço para colocar as minhas coisas. Isso porque o custo de vida em Paris é muitíssimo caro, e a não ser que você consiga pagar uma média de mil e duzentos euros por mês de aluguel para viver em um apartamento de 30 metros, vai precisar encarar a vida nos estúdios parisienses. Pelo menos no início.
Por isso, se você assistiu séries como Emily in Paris e viu o tamanho do lugar onde a personagem vive, desconfie! Eu ainda não tive vontade de assistir, mas ouvi muitos comentários sobre o tamanho da chambre de bonne (quarto de empregada) da Emily. Aqui, normalmente, uma chambre de bonne não passaria de 20 metros (aliás, existem muitos estudantes que topam pagar centenas de euros para morar em 10 metros).
É lógico: se você tem uma condição financeira elevada, Paris poderá te oferecer mais espaço e amplos salões haussmanianos*, com chaminés elegantes, lustres de cristal e detalhes dourados no teto. Mas esse luxo não é para todos, e o espaço custa caro.
*Haussmaniano é um adjetivo ligado ao Barão de Haussmann, antigo prefeito que transformou radicalmente a arquitetura e urbanismo de Paris nos anos entre 1850 e 1870. Ele padronizou as construções da capital, que substituíram as construções medievais antes presentes.
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Existe muita diversidade em Paris
Nos filmes hollywoodianos que temos oportunidade de assistir, Paris é retratada de uma forma muito homogeneizada. As pessoas se parecem, todos falam francês e todos têm a pele branca. São raros os filmes que mostram uma cidade mais diversa, composta de pessoas com diferentes origens, etnias, línguas e modos de se vestir.
No metrô você terá a oportunidade de cruzar com pessoas de origem árabe e africana, e entenderá línguas diferentes do francês. O modo de se vestir também pode variar: de vestidos étnicos coloridos a longas túnicas muçulmanas. Nem todo mundo veste sobretudo, salto alto e bolsa de grife, d’accord?
Se você quer ver uma realidade menos água com açúcar e entender como Paris é composta (e também como a cidade se relaciona com as periferias ao seu entorno), recomendo o filme La Haine, realizado por Mathieu Kassovitz (a ironia é que ele faz o par de Amélie, em O Fabuloso Destino de Amélie Poulain).
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Cotar Agora →Na contramão de muitos filmes franceses e hollywoodianos que só mostram uma Paris calma, pacífica e padronizada, La Haine consegue sair do lote e nos fazer ver o lado B.
O fato é que eu me surpreendi com essa multitude de pessoas, estilos e origens quando cheguei aqui. A cultura africana é muito celebrada e existem até mesmo bairros típicos onde você verá enormes corredores de cabeleireiros afros, por exemplo. Os muçulmanos também são muitos: vale dar um pulinho na Mosquée de Paris, no 13ème arrondissement (bairro número 13 daqui). A capital é mesmo multicultural e acolhe muitos perfis.
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Cada bairro um estilo
Cada bairro de Paris reserva um estilo diferente. Quando morei 13ème, frequentava supermercados orientais e estava acostumada com a quantidade de chineses que moram por lá. Já se você for para o 18ème e 19ème, encontrará forte presença africana e diferentes restaurantes típicos.
O 16ème reúne os burgueses, com jardins, grandes hotéis e monumentos. E o 2ème conta com a efervescência comercial, reunindo várias startups. Mas o 5ème é meu favorito: igualmente caro em termos de aluguel, mas você tem a Notre Dame por perto e outros pontos simpáticos como a Ile Saint Louis não muito longe.
Enfim você vai perceber que Paris não é uma cidade homogênea e que cada bairro tem uma personalidade particular. Por falar nisso, é melhor prestar atenção para não se perder: as regiões próximas dos metrôs La Chapelle, Barbès e Stalingrad costumam ser um pouco perigosas ao anoitecer, pois o tráfico de drogas acontece em grande número por lá. Sim, como praticamente todas as cidades grandes do mundo, problemas de segurança na França também existem, e Paris não é exceção.
A França não é só Paris
Outro ponto muito martelado nos filmes e séries que retratam a França: parece que só existe Paris! E quando existe uma menção a uma outra região, a capital sempre aparece por cima, como sendo melhor. Essa visão tem mudado (e muito) desde que a pandemia começou.
Cada vez mais pessoas deixam a capital para viver uma vida com mais qualidade e menos custosa em outras regiões e pequenas cidades da França. Como sou casada com um normand (pessoa que nasce na região da Normandia), tive a sorte de escutar esse discurso várias vezes, o de que um país inteiro não se resume a uma cidade.
O sul é uma região que te abraça: primeiro pela maior abertura e descontração das pessoas que lá vivem, donas de um sotaque melodioso, e segundo por ser presenteada com temperaturas bem mais altas do que o resto da França. Já a Normandia (norte) e a Bretanha (oeste) reservam uma riqueza cultural impressionante. A Bretanha, com suas ruínas medievais e sua parte costeira belíssima, e a Normandia com a sua natureza generosa.
Existe ainda a parte basca, que eu ainda não visitei e dizem ser querida pelos surfistas. A certeza é que há muito para explorar e visitar: A cidade Luz saberá te entreter sem nenhuma dificuldade, mas a França não é só Paris para entender o país e captar a sua essência.
A Paris dos filmes existe, mas só para a minoria
Se você pensa em acordar, abrir a janela, dar bom dia para a Torre Eiffel, tomar café da manhã em um bistrô em Saint-Germain-des-Prés, almoçar no Ritz e ir às compras no Marais, bom, é melhor ter a carteira bem rempli (cheia), como dizem aqui.
A rotina do parisiense médio é pegar o metrô bem cheio na hora do pico, ter uma rotina de trabalho normal e curtir a cidade aos finais de semana. O famoso “metro, boulot, dodo” (metrô, trabalho, dormir), expressão conhecida por todos daqui. Na maior parte das vezes, os parisienses nem moram na cidade Luz, mas sim, nas cidades perto de Paris.
Eles preferem ir para a periferia da cidade para que possam economizar um pouquinho no aluguel e terem mais espaço (principalmente os casais com filhos).
Essa magia, contudo, continua a existir para nós, estrangeiros, que achamos tudo tão diferente. Lembro que, quando cheguei, queria fotografar todas as portas, pois as achava lindas, enormes e cheias de detalhes. Os pormenores da rotina do parisiense não passavam despercebidos aos meus olhos.
Ainda sim, tive que aprender a viver em uma cidade real, que demanda recursos e dinheiro o tempo todo, mas compensa tudo isso com uma veia cultural efervescente. Ainda existe magia, com certeza, mas ela é como um livro de realismo fantástico: você sabe que vai se deslumbrar várias vezes por dia, mas a realidade se sobressai quando você decide ficar.
Agora que já conhece a Paris da ficção versus a Paris real, saiba também o que eu achava estranho e engraçado quando cheguei à França.